PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO PROCESSO n° 0001537-24.2013.5.07.0012 (RO) RECORRENTE: MUNICIPIO DE FORTALEZA - PREFEITURA MUNICIPAL RECORRIDO: ANA CELIA MENEZES DA SILVA, INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO E APOIO A GESTAO EM SAUDE RELATOR: PLAUTO CARNEIRO PORTO EMENTA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CULPA "IN VIGILANDO". SUMULA 331, V, DO TST. ADC 16. Cabe ao ente público, quando postulada em juízo sua responsabilização pelas obrigações trabalhistas inadimplidas pelo prestador de serviços, carrear aos autos os elementos necessários à formação do convencimento do magistrado (arts. 333, II, do CPC e 818 da CLT), ou seja, provas suficientes à comprovação de que cumpriu o dever disposto em lei de fiscalizar a execução do contrato administrativo. Não se desincumbindo desse ônus, forçoso reconhecer a culpa "in vigilando" do ente público, fazendo incidir a sua responsabilidade subsidiaria, nos termos da súmula 331, V, do TST. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 219, I, DO TST. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. Preenchidos os requisitos previstos na Súmula 219, I, do TST, quais sejam, ser a reclamante beneficiária da gratuidade judiciária e encontrar-se assistida por sindicato, é cabível a concessão de honorários advocatícios na Justiça do Trabalho. RELATÓRIO Inconformado com a sentença (ID aace85f), proferida pelo Juízo da 12a Vara do Trabalho de Fortaleza, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio a Gestão em Saúde, e, subsidiariamente, o Município de Fortaleza, a pagar à reclamante as parcelas rescisórias, interpôs recurso ordinário o ente público (ID 3312b43). Preliminarmente, argui a ilegitimidade passiva ad causam. Sustenta a ausência de responsabilidade subsidiária, a insubsistência dos itens IV e V da Súmula n° 331, do TST, ante o efeito vinculante da declaração de constitucionalidade do art. 71, § 1° da Lei n° 8.666/93 pelo STF. Ratifica a inexistência dos elementos configuradores da culpa in vigilando e in eligendo no tocante à execução do contrato firmado com o primeiro reclamado. Ressalta a impossibilidade de contratação de pessoal, sem prévia aprovação em concurso público, após a Constituição Federal de 1988. Afirma que é incabível a condenação em honorários advocatícios. Requer o provimento do apelo. Sem contrarrazões. Parecer da Procuradoria Regional do Trabalho (ID b0bb39f), pelo conhecimento e desprovimento do recurso. ADMISSIBILIDADE O recurso foi apresentado no prazo legal. A representação processual encontra-se regular e o interesse de agir resta evidente, diante da procedência parcial dos pedidos ventilados na inicial. Conhece-se do recurso ordinário interposto pelo Município de Fortaleza. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM Não prospera, pois a pretensão exordial, quanto ao recorrente, consiste em imputar-lhe a responsabilidade subsidiária para garantir o pagamento das verbas trabalhistas, o que é suficiente para atribuir -lhe legitimidade passiva ad causam, devendo-se ressaltar, ainda, que a matéria, objeto da arguição, diz respeito a aspectos de mérito, que serão adiante analisados. MÉRITO DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. O STF no julgamento do mérito da ADC n° 16, em que se objetivava a declaração de que o art. 71, § 1°, da Lei 8.666/93 seria válido segundo a CF/88, manifestou-se pela sua constitucionalidade, declarando que a mera inadimplência do contratado (empresa interposta) não teria o condão de transferir à Administração Pública (tomadora de serviço) a responsabilidade pelo pagamento dos encargos trabalhistas. Com esse entendimento, firmou-se posição no sentido da inexistência de qualquer esteio legal que autorize a imputação à Administração Pública de responsabilidade objetiva pelos danos perpetrados por pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público contratada aos seus empregados. Frise-se que, no julgamento da indigitada contenda, o STF não se reportou à culpa "in eligendo", mas apenas a "in vigilando". Assim, observou-se que a responsabilidade subjetiva da Administração Pública deverá ser investigada, em tese, diante da ausência de vigilância, ou seja, culpa "in vigilando", se configurada a relevante omissão do Órgão Público, que por se revelar em ato omissivo, deverá ser rigorosamente evidenciado na Justiça do Trabalho à luz do contraditório. Portanto, os Tribunais trabalhistas não poderão generalizar os casos, devendo-se perquirir com mais rigor se a inadimplência tem como causa principal a falha ou falta de fiscalização pelo órgão público contratante. No tocante à fiscalização, dispõe o inciso III, do art. 58, da Lei 8.666/93: Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: III - fiscalizar-lhes a execução. Complementa o art. 67 do mesmo diploma legal, dispondo o seguinte: Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição. Decorre, portanto, dos comandos legais a obrigação da administração pública de acompanhar e fiscalizar a execução dos contratos administrativos de prestação de serviços. Nesse ponto, o ônus probatório do dever de fiscalização há de ser transferido à própria administração, por força do principio da aptidão para a prova. Dessa forma, cabe ao ente público, quando postulada em juízo sua responsabilização pelas obrigações trabalhistas inadimplidas pelo prestador de serviços, carrear aos autos os elementos necessários à formação do convencimento do magistrado (arts. 333, II, do CPC e 818 da CLT), ou seja, provas suficientes à comprovação de que cumpriu o dever disposto em lei. In casu, restou incontroverso que entre o Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio à Gestão em Saúde (IDGS) e o Município de Fortaleza foi firmado um contrato, sendo o Município o verdadeiro tomador dos serviços prestados pela autora. Por sua vez, o ente público não cuidou do ônus da prova a seu encargo, não indicando qualquer elemento ou indício que comprovasse o cumprimento da obrigação legal que lhe é imposta de fiscalização da execução do contrato administrativo (artigos 58, III, e 67, caput e § 1°, da Lei n° 8.666/93). A conduta omissiva do Município de Fortaleza no tocante à fiscalização da execução do contrato, permitiu que o reclamado deixasse de pagar regularmente à sua empregada as verbas trabalhistas que lhe eram devidas, restando evidenciada, nessa senda, a culpa "in vigilando", hábil a justificar a atribuição de responsabilidade subsidiária ao ente público reclamado, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil. Ao adotar tal compreensão, não se está declarando a incompatibilidade do art. 71 § 1°, da Lei 8.666/93 com a Constituição Federal, mas sim se demarcando o alcance da regra nele insculpida por intermédio de uma interpretação sistemática com a legislação infraconstitucional, especialmente, com os arts. 58, III, e 67 da aludida Lei de Licitações e 186 e 927 do Código Civil, que possibilitam a imputação de responsabilidade subsidiária ao ente público, caso evidenciada sua culpa "in vigilando". Entendeu o STF no julgamento da referida ADC n°16, que "a mera inadimplência do contratado não poderia transferir à Administração Pública a responsabilidade pelo pagamento dos encargos, mas reconheceu-se que isso não significaria que eventual omissão da Administração Pública, na obrigação de fiscalizar as obrigações do contratado, não viesse a gerar essa responsabilidade", consoante se extrai do Informativo de Jurisprudência n° 610, disponível no sítio da Corte Suprema na internet. Vale transcrever, por bastante elucidativo, o seguinte precedente do C.TST: AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA - MUNICÍPIO - ADC 16 - CULPA IN VIGILANDO - OMISSÃO DO ENTE PÚBLICO NA FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. Nos termos do entendimento manifestado pelo E. STF, no julgamento da ADC-16, em 24/11/2010, é constitucional o art. 71 da Lei 8666/93, sendo dever do judiciário trabalhista apreciar, caso a caso, a conduta do ente público que contrata pela terceirização de atividade-meio. Necessário, assim, verificar se ocorreu a fiscalização do contrato realizado com o prestador de serviços. No caso em exame, o ente público não cumpriu o dever legal de vigilância, registrada a omissão culposa do ente público, ante a constatada inadimplência do contratado no pagamento das verbas trabalhistas, em ofensa ao princípio constitucional que protege o trabalho como direito social indisponível, a determinar a sua responsabilidade subsidiária, em face da culpa in vigilando. Agravo desprovido. (TST-AIRR-4567- 76.2010.5.01.0000, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6a Turma, DEJT de 28/01/11). Nesse sentido, é o entendimento do item V introduzido na Súmula 331 do C.TST, por força do indigitado "decisum" do Pretório Excelso: V - Os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. Como se não bastassem esse claros preceitos da própria Lei n° 8.666/93, que devem ser interpretados e aplicados de forma conjunta e sistemática com o multicitado art. 71, § 1° da mesma norma, a matéria foi expressamente regulamentada no âmbito da Administração Pública Federal pela Instrução Normativa (IN) n° 2, de 30/04/2008, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG). A Instrução Normativa (IN) n° 2/2008, que fixa as diretrizes para uma fiscalização eficaz sobre os contratos de terceirização em matéria trabalhista, traz o cerne que deve balizar o julgamento de ações que visam à responsabilidade subsidiária do ente público, conforme se infere dos arts. 34, § 5° e incisos e 35, conforme se transcreve: § 5° - Na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas e sociais nas contratações continuadas com dedicação exclusiva dos trabalhadores da contratada, exigir-se-á, dentre outras, as seguintes comprovações: I - no caso de empresas regidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas: a) recolhimento da contribuição previdenciária estabelecida para o empregador e de seus empregados, conforme dispõe o artigo 195, § 3° da Constituição Federal, sob pena de rescisão contratual; b) recolhimento do FGTS, referente ao mês anterior; c) pagamento de salários no prazo previsto em lei, referente ao mês anterior; d) fornecimento de vale transporte e auxílio alimentação quando cabível; e) pagamento do 13° salário; f) concessão de férias e correspondente pagamento do adicional de férias, na forma da lei; g) realização de exames admissionais e demissionais e periódicos, quando for o caso; h) eventuais cursos de treinamento e reciclagem; i) encaminhamento das informações trabalhistas exigidas pela legislação, tais como: a RAIS e a CAGED; j) cumprimento das obrigações contidas em convenção coletiva, acordo coletivo ou sentenças normativas em dissídio coletivo de trabalho; k) cumprimento das demais obrigações dispostas na CLT em relação aos empregados vinculados ao contrato. É interessante ressaltar aqui que, embora o regulamento citado seja destinado aos órgãos federais, pode servir como orientação para analisar as condutas dos demais órgãos. No caso dos autos, o Município de Fortaleza não demonstrou que praticou os atos de fiscalização do cumprimento, pelo reclamado, das obrigações trabalhistas referentes à trabalhadora terceirizada. O que é suficiente, por si só, para atestar a conduta omissiva da Administração, configurando-se sua culpa "in vigilando". Registre-se que não versa a hipótese sobre contrato nulo, porquanto o Município de Fortaleza não é parte empregadora, não havendo como se cogitar da exigência de concurso público para o contrato firmado entre a reclamante e o Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio a Gestão em Saúde, tampouco das consequências do seu não atendimento. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 0 TST, interpretando a Lei 5.584/70, possui entendimento sedimentado no sentido de que somente o sindicato pode prestar assistência judiciária ao trabalhador, limitando, ainda, o cabimento de honorários advocatícios às demandas movidas por obreiros que, assistidos pelo sindicato, percebam até dois salários mínimos. Esse entendimento encontra-se sedimentado na súmula 219, item I, que versa o seguinte: SUM - 219 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HIPÓTESE DE CABIMENTO (nova redação do item II e inserido o item III à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 1 - Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. Observa-se, na vertente hipótese, que estão preenchidos por completo os requisitos explicitados na súmula 219, I, do TST. A reclamante está assistida pelo sindicato (ID 1172016), é beneficiária da Justiça Gratuita (ID 1172016 Pág. 2). Preenchidos os requisitos da Súmula n° 219, I, do TST, é cabível a concessão de honorários advocatícios. Acórdão Acordam os Desembargadores da 3a Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 7a Região, por unanimidade, conhecer do recurso, rejeitar a preliminar arguida e, no mérito, negar-lhe provimento. Participaram da votação os Desembargadores Plauto Carneiro Porto (Presidente e Relator), Fernanda Maria Uchôa de Albuquer