PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO PROCESSO n° 0000309-25.2014.5.17.0004 RECORRENTE: DIONNY NASCIMENTO DE OLIVEIRA RECORRIDO: FLÁVIO MOVEIS LTDA RELATOR: DESEMBARGADOR GERSON FERNANDO DA SYLVEIRA NOVAIS EMENTA INTERVALO INTRAJORNADA. REVELIA. Os efeitos da revelia consistem na inexistência de controvérsia sobre os fatos narrados na petição inicial e na aplicação da confissão ficta, mas essa é relativa, por conseguinte pode ser elidida por outras provas dos autos. Desse modo, se os cartões de ponto comprovam o intervalo intrajornada de 1h, indevidas as horas extras e reflexos a este título. 1. RELATÓRIO V I S T O S , relatados e discutidos. As partes adversas interpõem recurso ordinário e adesivo em face da r. sentença (Id.1e903f9) e complementada pela de embargos de declaração (Id.1ac68330) proferida pela MM. 4a Vara do Trabalho de Vitória. Razões do recurso da reclamada, Id.7b9a73a, arguindo preliminar de nulidade da sentença quanto à revelia aplicada e, no mérito, buscando a reforma da r. sentença quanto à revelia/busca da verdade real/horas extras. Custas e depósito recursal, respectivamente, Id. 7da4a9b e Id.e9ebf3e. Razões do recurso adesivo do reclamante, Id. e34db35, buscando a reforma da r. sentença quanto gratuidade da justiça; honorários advocatícios e multa do artigo 477, da CLT. Contrarrazões (Id.2aa4592) e (Id.5f5b2ba) pelo não provimento dos recursos. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 ADMISSIBILIDADE Conheço dos dois recursos porque presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade. Conclusão da admissibilidade Conheço dos dois recursos porque presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade. 2.2 PRELIMINARES MÉRITO RECURSO 2.2.1 PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA ARGUIDA PELA RECLAMADA A reclamada argui a preliminar em epígrafe sob o argumento de que lhe foi aplicada a revelia indevidamente, pois em audiência alertou o magistrado que o preposto havia se envolvido em um acidente de trânsito. Sustenta que posteriormente juntou documentos necessários para justificar a ausência. Sem razão, pois inexiste nulidade a ser declarada. Observe-se os termos da súmula 122, do C. TST in verbis : " N° 122 - REVELIA. ATESTADO MÉDICO. (INCORPORADA A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL N° 74 DA SDI-1) A reclamada, ausente à audiência em que deveria apresentar defesa, é revel, ainda que presente seu advogado munido de procuração, podendo ser ilidida a revelia mediante a apresentação de atestado médico, que deverá declarar, expressamente, a impossibilidade de locomoção do empregador ou do seu preposto no dia da audiência." Nessa linha de raciocínio, entende-se que a ausência do empregador ou de seu preposto à audiência para a qual a reclamada foi devidamente citada se justificaria somente se comprovado expressamente por atestado médico que naquele dia o empregador ou seu preposto estava impossibilitado de locomover- se. Pois bem. No caso em análise, vê-se da Ata de Audiência (Id.4523f43) que não há qualquer registro de concessão de prazo para apresentação de documentos para justificar a ausência do preposto, nem qualquer manifestação da parte solicitando prazo. Nota-se também que na Ata constou tão somente que o autor requereu a decretação da revelia e a consequente aplicação da pena de confissão à ré ausente e ainda que in verbis: [..] Incialmente a patrona da ré esclareceu que seu preposto estava preso no trânsito, posteriormente que o preposto se envolveu em um acidente de transito. Indagada sobre o nome do preposto e qual seria o veículo, não soube informar, justificando que é substabelecida, não tendo conhecimento de quem seria o preposto. A parte declara não ter provas a produzir, razão pela qual encerro a instrução processual. Em razões finais, a parte reporta-se aos elementos dos autos. Do teor da Ata acima transcrita em parte, conclui-se que a patrona da reclamada sequer tinha conhecimento do nome do preposto. E a advogada demonstrou fragilidade ao justificar a ausência do preposto quando primeiramente afirmou que o preposto estava preso no trânsito e, posteriormente, disse que estaria envolvido em um acidente. E, em sentença, o julgador fundamentou a aplicação da revelia à reclamada sob os seguintes termos: "Foi a reclamada devidamente citada da presente demanda; nada obstante, quedou-se revel, devendo suportar o ônus d ficta confessio, nos moldes do artigo 844 da CLT."A meu ver acertou o julgador. Vê-se também que embora não conste na Ata de Audiência qualquer pedido de concessão de prazo para justificar a ausência do preposto, a reclamada no dia seguinte à audiência apresentou petição (Id.d31cbeb) alegando que o preposto da ré Sr. Marcos Pinto Carvalho havia sido desligado da empresa no dia 21/05/2014, dia imediatamente anterior ao da audiência, razão pela qual foi necessário o deslocamento de outro funcionário para comparecer à audiência como preposta, a Sra Helenice Maria Pereira de Oliveira. Contudo, sustentou, a ré, que a preposta envolveu-se em um acidente de trânsito o que a impediu de comparecer à audiência e embora tenha acionado por diversas vezes o Batalhão de Polícia de Trânsito - BPTran/PMES, através do telefone de n° (27) 3232-8150, restou infrutíferas todas as oportunidades. Frise-se que o desligamento do preposto no dia anterior à audiência sequer foi alegado pela patrona da reclamada em audiência, portanto, questão nova em sede de justificativa posterior à audiência. Preclusa a sua arguição e sequer encontra liame com a ausência da preposta à audiência. Além disso, ressalto que a audiência ocorreu no dia 22 de maio de 2014, uma quinta-feira, enquanto que o documento colacionado aos autos pela reclamada para justificar a ausência do preposto e do boletim de ocorrência do acidente de trânsito em face da paralisação dos policiais, encontra-se no Id. 750db94, refere-se a notícia de jornal e tem o seguinte teor: Policiais civis de 13 estados anunciam greve de 24 horas nesta quarta 20/05/2014 19h24 Rio de Janeiro, 20 maio (EFE).- Os delegados, detetives e investigadores da Polícia Civil de 13 estados realizarão uma greve de 24 horas amanhã para exigir melhores salários e condições de trabalho, confirmaram nesta terça-feira fontes sindicais. A paralisação foi aprovada hoje em assembleias regionais pelos agentes da Polícia Civil de Alagoas, Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins. Conclui-se que a paralisação, conforme texto acima transcrito, diz respeito ao dia 21 de maio de 2014, quarta-feira, portanto, dia anterior ao da audiência. O outro documento apresentado pela reclamada de Id.65d23cd, jornal, apresenta o seguinte texto: " Espírito Santo Segundo o Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Espírito Santo, haverá uma assembleia na manhã de quarta para decidir sobre a adesão, na chefatura de polícia. Está previsto um protesto em Vitória." Contudo, sequer há prova contundente de que ocorreu a paralisação. E mesmo se assim não fosse, a alegação da ré é a de que a preposta foi envolvida em um acidente de trânsito que a impossibilitou de comparecer à audiência, mas não há prova desse acidente. Ressalto que a reclamada limitou-se a acionar o Batalhão de Polícia de Trânsito - BPTran/PMES, através do telefone de n° (27) 3232¬ 8150, mas apenas alegou o insucesso na obtenção do boletim. Ora, caberia à reclamada apresentar o boletim de ocorrência do acidente, mesmo que posteriormente, para robustamente comprovar suas alegações, mas manteve-se inerte. Em síntese, não há prova robusta de que a preposta tenha, de fato, ficado em uma situação de total impossibilidade de locomoção. Por fim, esclareço que o indeferimento do pedido de oitiva do depoimento pessoal do reclamante não caracteriza o cerceamento do direito de defesa, pois, em conformidade com o item II da Súmula 74 do TST, a confissão ficta somente pode ser elidida por prova pré-constituída nos autos. Rejeito a preliminar. Conclusão da preliminar Rejeito a preliminar. 3. MÉRITO 3.1 Recurso da Reclamada 3.1.1 HORAS EXTRAS. REVELIA. BUSCA DA VERDADE REAL. Os pleitos em epígrafe foram deferidos em face da aplicação da revelia e seus efeitos, em face da ausência do preposto à audiência. Os efeitos consistem na inexistência de controvérsia sobre os fatos narrados na petição inicial e na aplicação da confissão ficta, mas essa é relativa, por conseguinte pode ser elidida por outras provas dos autos. Contudo, se inexistem provas contrárias às alegações do autor, este faz jus às verbas pleiteadas. Por outro lado, se há provas contrárias, não faz. Nessa linha de entendimento, merece reparo a r. sentença somente quanto às horas extras a título de intervalo intrajornada, pois os cartões de ponto (Id.9108c9d) comprovam a concessão de 1h de intervalo. Indevidas. Nos mais, mantenho a r. sentença ante a aplicação da revelia e seus efeitos. Dou parcial provimento para excluir da condenação as horas extras a título de intervalo intrajornada e seus reflexos. Conclusão do recurso da reclamada Dou parcial provimento para excluir da condenação as horas extras a título de intervalo intrajornada e seus reflexos. 3.2 Recurso do Reclamante 3.2.1 GRATUIDADE DA JUSTIÇA A assistência judiciária gratuita aos que não têm recursos suficientes para demandar sem prejuízo do próprio sustento ou do de sua família constitui direito fundamental, de aplicação imediata, ex vida Constituição Federal (art. 5.°, inc. LXXIV e § 1.°). Se a insuficiência de recursos foi demonstrada, o patrocínio da causa por advogado particular, por si só, não tem o condão de afastar essa garantia, sob pena de violação do texto constitucional. É importante destacar que a Orientação Jurisprudencial n.° 304 do C. TST reza que "para a concessão da assistência judiciária, basta a simples afirmação de hipossuficiência do declarante ou de seu advogado, na petição inicial, para se considerar configurada a sua situação econômica (art. 4°, § 1°, da Lei n.° 7.510/86, que deu nova redação à Lei n.° 1.060/50)". E não poderia ser diferente, tendo em vista que o art. 1° da Lei n.° 7.115/83 dispõe que se presume verdadeira, até que se prove o contrário, a declaração de pobreza. Ressalto que o reclamante não está assistido pelo Sindicato de sua Categoria, mas declarou não ter condições de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo do próprio sustento e do de sua família alínea "h" de sua petição inicial. Dou provimento. 3.2.2 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Primeiramente, importante consignar que o empregado, à época da vigência do contrato de trabalho, percebia salário inferior ao dobro do mínimo legal, conforme contracheque de ID. 775b83f, em que conta a remuneração total de R$1.430,68, em janeiro de 2014 enquanto que o dobro do salário mínimo é R$1.448,00. Ademais, não há notícias de que o reclamante encontra-se empregado o que torna presumível a situação econômica que não lhe permite demandar sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família, fato, inclusive, que foi declarado na alínea "h" da peça vestibular. E, ainda que assim não fosse, irrelevante, ao meu entender, para apreciação do pedido, a assistência sindical, miserabilidade jurídica ou salário inferior ao dobro do mínimo e mesmo as Súmulas 219 e 329 do C. TST. Com efeito, a Constituição Federal assegura o direito de exercício da profissão aos que tenham efetivamente a habilitação exigida em lei e dispõe, em seu artigo 133, acerca da essencialidade da atuação do advogado em quaisquer processos, instâncias ou tribunais. Portanto, induvidoso que o artigo 791 da CLT deve ser interpretado em conformidade com o espírito da Carta de 1.988. Ademais, a verba honorária constitui direito do advogado, conforme artigo 22 do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei 8.906/94). Assim, aplico o art. 20 do CPC, em face da sucumbência do reclamado, prevalecendo, entretanto, o índice de 15% sobre o valor da condenação, limite máximo admitido nesta Especializada, consoante Súmula 219 do C. TST. Dou provimento. 3.2.3 MULTA DO ARTIGO 477, DA CLT Embora tenha o juízo de primeiro grau deferido as horas extras intrajornadas e escalas extras com reflexos nas verbas rescisórias, indeferiu o pleito de multa do artigo 477 da CLT sob o fundamento de que as verbas rescisórias foram pagas no prazo legal. Com a devida vênia merece reforma a r. sentença no particular. A multa do artigo 477, §8.° da CLT é devida quando o pagamento das verbas rescisórias é realizado fora do prazo ou a menor, o que ocorre com o reconhecimento, em juízo, de parcelas não quitadas pela reclamada por ocasião da rescisão contratual. Assim, reconhecida, por meio de sentença, a ausência do pagamento de alguma parcela, tem-se que não foram pagas corretamente as verbas rescisórias, impondo-se a aplicação da multa. Ora, o texto legal não faz qualquer ressalva quanto à relação jurídica controvertida, limitando-se a isentar o empregador do pagamento da multa, apenas quando o trabalhador der causa à mora, o que não é o caso dos autos. Anote-se que há recente julgado do Colendo Tribunal Superior do Trabalho (TST) perfilhando a orientação aqui desenvolvida, senão vejamos: MULTA PREVISTA NO ART. 477, § 8°, DA CLT. DIFERENÇ AS DE VERBAS RESCISÓRIAS. DEFERIDAS EM JUIZO. A circunstância de as diferenças de parcelas rescisórias terem sido deferidas em juízo não afasta, por si só, a imposição ao pagamento da multa prevista no art. 477, § 8°, da CLT. (Processo: E-RR - 96700¬ 92.2007.5.17.0002. Data de Julgamento: 04/10/2012, Relator Ministro João Batista Brito Pereira, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT19/10/2012.) Ressalte-se, portanto, que é irrelevante para o deferimento ou não da referida multa a existência de controvérsia sobre o pagamento das verbas rescisórias. Dou provimento