PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO PROCESSO n° 0000080-09.2014.5.23.0001 (RO) RECORRENTE: ANTONIO ARCANJO DOS SANTOS RECORRIDO: CONCREMAX CONCRETO ENG E SANEAMENTO LTDA RELATOR: JULIANO GIRARDELLO EMENTA JUSTA CAUSA. CARACTERIZAÇÃO. ATO DE IMPROBIDADE . Segundo a doutrina trabalhista, a falta grave denominada de 'ato de improbidade' pode ser definida como conduta vinculada à execução do contrato que afronta a ordem jurídica e os parâmetros gerais ditados pela moral, mediante a qual o empregado obtém vantagem ilegítima para si ou para outrem, lesando o patrimônio do empregador ou de terceiro. Nessa perspectiva, há que se reconhecer que o Autor incorreu na falta catalogada na alínea 'a' do art. 482 da CLT, visto que os elementos do acervo probatório denunciam que ele, no contexto da relação laboral, praticou ato que se traduz em violação aos princípios ditados pela boa fé, com o flagrante propósito de obter um enriquecimento ilícito, o que se traduz em vilipêndio ao patrimônio do empregador. Nessa perspectiva, cumpre reconhecer que o caso concreto autoriza a extinção do vínculo empregatício sob a modalidade de dispensa por justa causa. RELATÓRIO A 1a Vara do Trabalho de Cuiabá/MT, por intermédio da r. decisão ID. ea83355, da lavra da Excelentíssima Juíza Bianca Cabral Doricci, cujo relatório adoto, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condenar a Ré ao pagamento do adicional de periculosidade no importe de 30% sobre o salário mensal, considerada a evolução salarial, desde a admissão até abril de 2012, com reflexos em gratificação natalina, férias mais 1/3 e FGTS (que deverá ser depositado na conta vinculada). Concedeu à parte autora os benefícios da justiça gratuita. O Autor opôs embargos de declaração sob o ID. aa8de22, os quais foram acolhidos, em parte, para sanar erro material constante no relatório da sentença (ID. f985303). O Autor, inconformado, interpôs recurso ordinário ID. b66a9a6, por meio do qual postula a reforma da sentença no tocante à modalidade da extinção do contrato de trabalho, à estabilidade decorrente da participação na CIPA, indenização por danos morais decorrentes da demissão por justa causa e multa do artigo 477 da CLT. Contrarrazões ofertadas pela Ré sob o ID. 1abde69. Dispensada a remessa dos autos à Procuradoria Regional do Trabalho, por força do disposto no art. 46 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal. É, em síntese, o relatório. FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE Presentes os pressupostos processuais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto, bem assim das contrarrazões ofertadas. MÉRITO JUSTA CAUSA A sentença considerou válida a dispensa por justa causa aplicada pela empresa, com respaldo no artigo 482, "a", da CLT, por ato de improbidade, na data de 20/12/2013, por ter ficado comprovado nos autos que o Autor participou de um furto ocorrido na empresa, consoante as filmagens realizadas pela Ré. Concluiu que tal ato acabou por quebrar a confiança indispensável à manutenção do contrato de trabalho. Contra essa decisão, insurge-se o Autor alegando que que sua demissão, sob essa modalidade, foi injusta, haja vista a não comprovação de sua participação no furto ocorrido na empresa. Insiste em afirmar que a sentença recorrida está eivada de obscuridade, pois, a seu entender, o Juízo concluiu ter ele confessado a participação no furto dos cabos na obra em que trabalhava, fato que alega não ter ocorrido, tampouco ficou comprovado nos autos. Pois bem. A sentença não merece reparos. Para a doutrina abalizada, a justa causa "[...] é o motivo relevante, previsto legalmente, que autoriza a resolução do contrato de trabalho por culpa do sujeito contratual comitente da infração." (Maurício Godinho Delgado, in Curso de Direito do Trabalho, 9 a ed., São Paulo: LTr, 2010). Cediço é que a penalidade mais severa e grave a ser aplicada ao empregado que comete infrações trabalhistas traduz-se na ruptura do contrato de trabalho por justa causa, cumprindo salientar que para tal mister exige a observância de critérios, classificados pela doutrina contemporânea, como objetivos, subjetivos e circunstanciais. Os critérios objetivos constituem os requisitos responsáveis pela caracterização da conduta obreira que se busca penalizar. Incluem- se, neste critério, a tipicidade da conduta, a natureza da matéria envolvida e a avaliação da gravidade do ato. Já os critérios subjetivos referem-se ao envolvimento ou não do empregado na conduta tida como censurável, incluindo-se, assim, a definição da autoria da infração e a verificação de dolo ou culpa em face da falta praticada. E, por fim, na seara dos critérios circunstanciais, serão avaliados, especialmente, o nexo causal, a adequação e a proporcionalidade entre a falta e a pena aplicada; imediaticidade da punição (ausência de perdão tácito); singularidade da punição (non bis in idem); inalteração da punição; ausência de discriminação e caráter pedagógico do exercício do poder disciplinar, com a correspondente gradação de penalidades. A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 482, alínea "a", aponta o ato de improbidade como justa causa para rescisão contratual. O ato de improbidade consiste em "conduta faltosa obreira que provoque dano ao patrimônio empresarial ou de terceiro, em função de comportamento vinculado ao contrato de trabalho, com o objetivo de alcançar vantagem para si ou para outrem." (Maurício Godinho Delgado, in Curso de Direito do Trabalho, 10. ed., São Paulo: LTr, 2011, p. 1137). O ponto fulcral da composição do conflito de interesses consiste em aferir se os elementos da lide permitem ou não a caracterização de falta grave, autorizadora da incidência do instituto da dispensa por justa causa, cabendo à empresa o ônus de provar que o empregado praticou atos capazes de quebrar a fidúcia nele depositada, de modo a ensejar a extinção do vínculo empregatício com base em algumas das hipóteses previstas no art. 482 da CLT. Extraio dos autos que o Autor foi dispensado de forma motivada (art. 482, a, da CLT) por ter agido em desconformidade com as normas internas da empresa e com os padrões de conduta profissional, por ter sido partícipe de um furto de cabos da obra em que trabalhava. Na inicial, o Autor afirmou que teve seu veículo arrombado em 19/11/2013, oportunidade em que teve furtados seus pertences e documentos pessoais, de modo que, a partir de 09/12/2013, a empresa autorizou o Autor a estacionar seu veículo na área interna do canteiro de obras visando maior segurança para ele. Narra que, em seguida, em 19/12/2013, ocorreu um furto de cabos no interior do canteiro de obras, fato confessado pelo seu colega de nome Natalino, sendo que referidos cabos foram guardados e ocultados no interior do veículo do Autor. Segue narrando que a empresa tomou as providência para descobrir o ocorrido, mas que, em contrapartida, foi chamado pelo setor administrativo para confessar o furto, ocasião em que o chefe da segurança da empresa retirou um revólver da gaveta, ameaçando-o. Afirma que, mesmo ante essa coação, continuou mantendo sua posição de negar a participação no sinistro e, posteriormente, foi liberado pelo encarregado para retornar ao posto de trabalho para dar continuidade às tarefas. No dia seguinte, juntamente com o colega Natalino, foi dispensado por justa causa. Na contestação, a Ré informa que a dispensa por justa causa de fato ocorreu uma vez que o empregado Natalino afirmou, mediante declaração, que ele e o Autor combinaram o furto de cabos da empresa, sendo que aquele (Natalino) colocaria os cabos no veículo deste (Autor) que ficava dentro do canteiro de obras e, posteriormente, venderiam referidos cabos. Esclarece a Ré, que no dia 20/12/2013, o Natalino confessou perante a empresa e que, nesta ocasião, tanto ele como o Autor foram dispensados motivadamente. Segue afirmando que, após um telefonema anônimo, a Ré passou a filmar o funcionário Natalino no canteiro de obras, quando então o flagrou colocando cabos da obra no interior do veículo do Autor, sem qualquer ato de arrombamento do veículo, motivo pelo qual dispensou os dois juntos. Conforme acima exposto, os fatos imputados ao Autor foram filmados por câmeras da Ré, o que não se pode olvidar, entretanto, é que o ato faltoso imputado deve estar inequivocamente comprovado em juízo, não sendo suficiente para a comprovação da falta grave a mera filmagem feita no âmbito interno da empresa. Da análise das provas colhidas e documentos constantes nos autos, observo que o empregado Natalino, autor do furto ocorrido, prestou declarações espontâneas na empresa (ID. 1d551bd) assim que teve ciência do vídeo gravado, ocasião em que afirmou ter acertado com o Autor que ele, Natalino, retiraria os cabos da obra e colocaria no carro do Autor e que este levaria os cabos para o terminal de integração de ônibus do bairro CPA I, onde seria entregue para um amigo de Natalino que estaria aguardando no local. Em impugnação, o Autor alega que houve, na verdade, um flagrante armado envolvendo um terceiro e supostamente o veículo de sua propriedade, além de uma duvidosa declaração prestada por terceiro (ID. a5aa591 - Pág. 1). Argumenta que o declarante é pessoa conhecida por todos no local de trabalho como sendo usuária de drogas e que dispunha de poucos momentos de lucidez. Nesse passo, cabe averiguar se os atos faltosos imputados ao Autor estão de fato comprovados em sede de instrução processual. É incontroverso, nos autos, que o empregado Natalino colocou os cabos no veículo de propriedade do Autor, consoante as imagens do DVD gravado pela empresa. Verifica-se, também, que o Autor afirmou na peça de ingresso que não participou e nem tinha conhecimento do que o Natalino tinha feito e que, se fez, foi sem qualquer participação sua, seja ativa ou tácita. Contudo, em impugnação argumentou que a empresa provocou um flagrante, havendo possível conluio entre Natalino e a empresa, ou seja, trouxe tese distinta daquela trazida na inicial. Em instrução, o Autor afirmou: "[...] que foi dispensado por justa causa em razão de supostamente estar furtando cabeamento da empresa; o seu carro não ficava aberto do estacionamento; o seu veiculo é velho e mesmo trancado é possível abrir o porta malas; o Sr Natalino não disse que guardaria nada em seu veículo [...] no dia 12 de dezembro comunicou a empresa que sairia para buscar o Sr Laelcio, engenheiro; neste dia também iria buscar o seu BO em razão de um furto ocorrido dias antes em frente a empresa; antes que fosse buscar o Sr Laelcio, o mesmo ligou no celular do autor dizendo para retornar à empresa para vistoria o carro do autor; que pediu que retornasse o mais breve possível; que embora tivesse saído para buscar o engenheiro, em razão da comunicação do fato o mesmo foi sozinho até a empresa; pediu ao encarregado Maxwell para sair da obra; quando foi sair da empresa o funcionário da guarita não chegou a fazer vistoria em seu carro, mas debruçou na guarita para conversar e deu uma olhada rápida; fizeram a vistoria em seu carro o Sr Maxwell, Laelcio, José Maria (engenheiro civil) e Rubens (administrador da obra); [...] não acharam nada da empresa em seu carro e, então o Sr José Maria filmou tudo o que estava no carro e determinaram que retornasse ao trabalho; oito dias depois o autor foi chamado para assistir um vídeo que mostrava o Sr Natalino mexendo no carro do autor; [...] no vídeo viu o Sr Natalino colocando cabos em seu carro, mas não sabe o que aconteceu com os mesmos; que esse fato ocorreu no mesmo dia (mesma hora) em que o autor narrou ter saído da empresa para buscar o engenheiro; [...] melhor explicando foi dispensado no dia seguinte ao ter assistido o vídeo; [...]" (ID. 9c9b5c3 - Pág. 1/2). Desse depoimento, pode-se extrair que o empregado Natalino colocou os cabos no carro do Autor no mesmo dia que em que este precisou sair para buscar o Sr. Laelcio, engenheiro da obra, sendo incontroverso que foi chamado a retornar para a empresa, ocasião em que fizeram revista no carro dele e nada mais havia lá dentro. Presume-se, com isso, que o Autor saiu da empresa com os cabos no porta-malas colocados pelo Natalino e retornou para a empresa sem eles. Corroborando o mesmo entendimento, encontra-se o depoimento da testemunha conduzida pela empresa, José Maria Roquette Neto, ao afirmar que: "[...] o depoente trabalhou juntamente com o reclamante [...] o autor foi dispensado em razão de furto de cabos elétricos colocados em seu veiculo pelo Sr Natalino; que o Sr Natalino confessou que havia combinado com o autor de colocar os cabos em seu veículo para, então o autor levar até o terminal do CPA. [...] os fatos acima narrados ocorreram em 12.12.2013; estava na obra neste dia e recebeu uma ligação dizendo que um carro estava saindo da obra com cabos elétricos; que chegou na portaria e o carro já tinha ido embora; constatou-se que o carro que havia saído era do autor; o porteiro informou que o autor estava indo buscar o Sr Laelcio; o Sr laelcio chegou na obra e o depoente perguntou se o autor iria busca-lo e ele negou; o Sr Laelcio ligou para o autor e ele disse que estava resolvendo problemas pessoais; que o Sr Laelcio pediu que voltasse imediatamente tendo em vista um denuncia de que havia cabos elétricos em seu carro; o depoente voltou a obra e depois foi chamado pelo Sr Laelcio para verificar o carro do autor quando este retornou; o depoente olhou os cabos e tirou um foto constatando que os cabos do carro não eram utilizados na obra; que depois disso o chefe da segurança Amarildo, mostrou imagens, 2 dias depois, constatando o carro do Sr Antônio parado com o porta malas aberto e o Sr Natalino fazendo rolos com os cabos de 120 (um de cada cor) cortou com alicate, amarrou e colocou no carro; que fechou o carro e saiu de perto; a ligação aconteceu logo depois disso; o depoente estava na obra no dia da dispensa do autor mas não presenciou [...] quando vistoriou o carro não havia sinais de arrombamento [...]" (ID. 9c9b5c3 - Pág. 3). Com esse depoimento, a empresa conseguiu comprovar que o Autor não saiu para buscar o Sr. Laelcio, mas possivelmente para dar destino aos cabos furtados por Natalino, tanto que em seu depoimento pessoal e no de sua testemunha consta que foi o Sr. Laelcio quem determinou que o Autor voltasse imediatamente à empresa haja vista a denúncia de furto. Assim, o Sr. Laelcio não estava fora da empresa no momento do furto e da saída do veículo do Autor, indo de encontro a sua afirmação no sentido de que estava indo buscar o Sr. Laelcio. A outra testemunha conduzida pela Ré, Eduardo Luiz de Sá da Silva, para comprovar a veracidade das declarações feitas pelo Natalino no documento de ID. 1d551bd, afirmou que: "[...] dado vista ao depoente do documento ID 1d551bd, informa que estava presente no momento em que o Sr Natalino narrou os fatos ali descritos; além do depoente estavam presentes os Srs. Amarildo e Rubens [...]" (ID. 9c9b5c3 - Pág. 3). Outrossim, o fato é que o Autor saiu da empresa com o carro carregado de fios furtados pelo Natalino e retornou à empresa sem eles, não conseguindo dar explicações convincentes acerca do sumiço dos cabos colocados no porta-malas do seu veículo, tanto que em seu próprio depoimento assumiu que tudo isso aconteceu no mesmo dia e na mesma hora. Com efeito, a Ré se desincumbiu em demonstrar o justo mo