PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO PROC. N.° TRT - 0010451-16.2012.5.06.0182 (RO) Órgão Julgador : Primeira Turma. Relatora : Desembargadora Valéria Gondim Sampaio. Recorrente : USINA SÃO JOSÉ S/A. Recorrido : JOSÉ ROBERTO DE BARROS. Advogados : Humberto Araújo Pinto e Martinho Cunha Melo Filho. Procedência : 02a Vara do Trabalho de Igarassu (PE) EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE INTERROGATÓRIO DA PARTE E DE TESTEMUNHA, CUJA DISPENSA DE INTIMAÇÃO JÁ FORA ACEITA. ARTS. 765, 794, 825, 848, DA CLT, 131, DO CPC, 5°, LXXVII, DA CF. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA INEXISTENTE. I- O Magistrados que dispensa depoimentos pessoais não pratica ato de cerceamento do direito de defesa, eis que, a teor da norma contida no artigo 848 da CLT, o interrogatório das partes se constitui em prerrogativa do Juízo, que tem o poder de direção do processo, devendo zelar pela sua efetividade, celeridade e economia, "ex vi"do disposto nos arts. 765 do mesmo diploma legal, 131 do CPC e no inciso LXXVIII do art. 5°, da Constituição Federal. Referência a acesso a tutela jurisdicional célere como direito fundamental, sem que, como é curial, seja prejudicada a segurança jurídica, notadamente no âmbito do contraditório e do direito de defesa. É certo que, em muitos casos, revelar-se-ia extremamente útil e esclarecedor tomar as declarações orais dos litigantes. Não menos certo, porém, é que, para se contrapor à faculdade do Juízo, a parte teria que demonstrar a necessidade imperiosa da produção do ato, em face da defesa do direito em discussão, sobretudo se, considerando os demais elementos dos autos, revelarem-se despiciendos ao deslinde da controvérsia. É o caso, por exemplo, da existência de confissão real, de documento de teor incontroverso, etc. Trata-se de evitar a prática de atos inúteis, com vistas à celeridade e economia processual. Simples arguição de ferimento, desprovida de fundamento concreto, conduz ao inacolhimento da pretensão, pela prevalência do disposto no art. 794 da CLT, que consagra a tese de que "só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes". II- Por ilação, de idêntico modo não fere o direito de defesa, indeferir pedido de adiamento de sessão de audiência, ante a falta injustificada de testemunha, cuja intimação fora dispensada pela parte interessada, de modo inequívoco, com supedâneo no art. 825 da CLT. Vistos etc. Recurso Ordinário interposto por USINA SÃO JOSÉ S/A, em face da decisão proferida pelo MM. Juízo da 02a Vara do Trabalho de Igarassu (PE) (ID 81930), que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na Reclamação Trabalhista ajuizada por JOSÉ ROBERTO DE BARROS. Em razões (ID 81923), enfatiza a ocorrência de nulidade processual por cerceamento do direito de defesa, por mais de um fundamento, bem como a existência de justa causa rescisória praticada pelo autor. Sustenta ser indevida a condenação no tocante às verbas rescisórias; à multa prevista no art. 477, § 8°, da CLT e às horas de percurso. Contrarrazões apresentadas (ID 81919). Em conformidade com o art. 20 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, c/c art. 50 do Regimento Interno deste Sexto Regional, não houve remessa à Procuradoria Regional do Trabalho. É o relatório. VOTO: Das preliminares de nulidade processual por cerceamento do direito de defesa, suscitadas pela recorrente Recebo como preliminares as arguições de nulidade processual por cerceamento do direito de defesa, lastreadas em mais de uma razão, e as rejeito, de acordo com os fundamentos a seguir expostos. De fato, não caracteriza cerceamento de direito de defesa o indeferimento, por ato fundamentado do Juízo, de pedido de adiamento de sessão de audiência, ante a falta injustificada de testemunha, posto que constou assentado antes, em ata judiciária, "que as partes comprometem-se de trazer prova testemunhal independentemente de notificação, renunciando aos termos do parágrafo do art. 825 da CLT" (ID 81933), sem que tenha havido insurgência a respeito. De outra parte, há ponto controverso, alvo de protestos, inclusive, quanto à dispensa do depoimento pessoal das partes, por ato do Juízo, qualificado pela recorrente de inconstitucional, por ferimento ao art. 5°, LV, da Constituição da República. No entanto, aos Magistrados é dado dispensar depoimentos pessoais, eis que, a teor da norma contida no artigo 848 da CLT, o interrogatório das partes se constitui em prerrogativa do Juízo, que tem o poder de direção do processo, cuidando de zelar pela sua efetividade, celeridade e economia, "ex vi"do disposto nos arts. 765 do mesmo diploma legal, 131 do CPC e no inciso LXXVIII do art. 5°, da Constituição Federal, que se refere ao acesso à tutela jurisdicional célere como direito fundamental, sem que, como é curial, seja prejudicada a segurança jurídica, notadamente no âmbito do contraditório e do direito de defesa. É certo que em muitos casos revelar-se-ia extremamente útil e esclarecedor tomar as declarações orais dos litigantes. Não menos certo, porém, é que, para se contrapor à faculdade do Juízo, a parte teria que demonstrar a necessidade imperiosa da produção do ato, em face da defesa do direito em discussão, sobretudo se, considerando os demais elementos dos autos, revelarem-se despiciendos ao deslinde da controvérsia. É o caso, por exemplo, da existência de confissão real, de documento de teor incontroverso, etc. Trata-se de evitar a prática de atos inúteis, com vistas à celeridade e economia processual. Simples arguição de ferimento, desprovida de fundamento concreto, como fez a recorrente, conduz ao inacolhimento da pretensão, pela prevalência do disposto no art. 794 da CLT, que consagra a tese de que "só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes". A esse propósito, o seguinte aresto, que expressa o entendimento jurisprudencial dominante: " DISPENSA DO INTERROGATÓRIO DO LITIGANTE. NULIDADE PROCESSUAL POR CERCEAMENTO DE DEFESA. O indeferimento do interrogatório da parte,não importa em restrição ao direito de defesa, em virtude do princípio do livre convencimento motivado (art. 131 do CPC),da ampla liberdade na direção do processo de que está investido o magistrado trabalhista (art. 765 da CLT) e por força do art. 848 da CLT, que confere ao magistrado trabalhista a prerrogativa para decidir sobre a pertinência de se interrogar os litigantes. Recurso de Revista conhecido, mas a que se nega provimento. DECISÃO: Por unanimidade, conhecer do recurso de revista quanto ao tema "Dispensa de Oitiva do Reclamante. Nulidade Processual por Cerceamento de Defesa" por divergência jurisprudencial e, no mérito, negar-lhe provimento". (RR - 1630-2000-651-09-00, Relator Ministro: Rider Nogueira, Data de Julgamento: 05/1 1/2003, 5a Turma, Data de Publicação: 28/1 1/2003) "In casu", o Magistrado de Primeiro Grau dispensou o interrogatório de ambos os litigantes, em sucessivo passando a colher o depoimento da única testemunha trazida a Juízo, por parte do reclamante, não havendo falar em violação à ordem jurídica. Neste passo, preleciona Manoel Antônio Teixeira Filho, em sua obra "A prova no Processo do Trabalho", Editora LTr, 8a edição, pagina 231, textual: "(...) no processo do trabalho, ao contrário do comum, o interrogatório (ou a audiência) das partes é ato de iniciativa exclusiva do Juiz. Nessa mesma linha de raciocínio, entendemos que o indeferimento, pelo Juiz, de requerimento da parte, no sentido de determinar a intimação da outra para vir a Juízo a fim de depor, não configura restrição de defesa, não sendo, pois, causa de nulidade processual, por suposto. O mesmo se diga na hipótese de, em audiência, o Juiz dispensar, 'sponte' sua, o interrogatório dos litigantes, ainda que presentes". Nesse sentido, precedentes deste E. Tribunal, os quais são espelho da ausência de dissenso jurisprudencial de relevo: "Aduz o recorrente, primeiramente, que a dispensa do depoimento dos representantes dos reclamados cerceou o seu direito de defesa. Sem razão, contudo. Com efeito, o Juiz tem a direção do processo (art. 765 da CLT) e o poder de dispensar o depoimento da parte, eis que o fato que com ele se pretendia demonstrar já se encontrava esclarecido nos autos. Salienta-se, ainda, que o interrogatório das partes é faculdade do Juiz, inteligência do art. 820 da CLT. Portanto inexiste cerceamento do direito de defesa." (PROC. N.° TRT- RO 4634/98, Órgão Julgador: 2a Turma, Des. Relatora: Josélia Morais da Costa) "(...) inexistiu o cerceamento de defesa alegado no recurso, em face da dispensa do depoimento do reclamante, porquanto, a teor da diretriz do artigo 765 da CLT, cabe ao juízo o direcionamento do processo, sendo-lhe facultado dispensar o depoimento das partes. Ademais, como bem se expôs no acórdão, o objetivo do interrogatório é o de esclarecer o juiz acerca dos fatos discutidos nos autos - e não a confissão da parte contrária. Assim, apenas na hipótese de se demonstrar, de plano, o prejuízo alegado, nenhuma nulidade pode ser declarada - entendendo que os demais elementos de prova colacionados aos autos davam subsídios ao julgamento." (PROC. N.° TRT - 01312-2003-001-06-00-5, Órgão Julgador: 2a Turma, Des. Relator: Ivanildo da Cunha Andrade, publicado no D.O.E. em 16/04/2005) Mediante tais fundamentos, afasto a declaração pretendida, notadamente pela análise de mérito que se segue, demonstrando o acerto da providência jurisdicional. Da justa causa Insurge-se em face da sentença que afastou a justa causa despeditiva apontada, consubstanciada na alínea "e" do artigo 482 da CLT, relativa a suposto ato de desídia, correspondente a acidente que teria sido causado pelo reclamante, mediante utilização de veículo trator de modo irresponsável e contrário às orientações passadas, "colocando em risco a sua própria vida e a dos demais trabalhadores que estavam no local", além de causar danos à empresa. Composta a lide e colhidas as provas, constato que a ré, na qualidade de empregadora, não se desincumbiu do ônus de evidenciar a prática do ato faltoso, quando seu era o encargo processual, "ex vi" dos termos do artigo 333, II, do CPC. Com efeito, na hipótese, não foi produzida prova destinada a comprovar as alegações aduzidas pela empresa, ressaltando-se que, ao contrário do que alega, inexiste, na exordial, confissão, sendo certo que ali o recorrido relatou ter sido o acidente, cuja culpa foi a ele imputada, decorrente de falha no freio do veículo, o que veio a ser corroborado por sua testemunha, que afirmou "que não havia manutenção nas máquinas com frequencia, que era comum haver acidentes com os tratores da usina" (ID 81931). Na verdade, a arguição de prática de falta grave, pelos efeitos danosos que pode trazer à vida pessoal e profissional do trabalhador, bem assim pelo Princípio da Continuidade do Vínculo de Emprego, requer prova vigorosa a cargo do empregador, que assume o ônus ao apontar qualquer das condutas tipificadas no art. 482 da CLT. Trata-se de fato impeditivo do direito que atrai a aplicação do art. 333, inciso II, do CPC c/c com o art. 818 da CLT. Descaracterizada, portanto, a ocorrência de ato grave faltoso que pudesse ao empregado ser imputado, admito não haver o que rever na sentença, no particular. Da multa do art. 477, §8°, da CLT A multa prevista no artigo 477, §8°, da CLT é devida ante a ausência de quitação tempestiva dos títulos da rescisão, pois, muito embora tenha havido discussão acerca da motivação da rescisão contratual e a justa causa aplicada pela empregadora não tenha sido constatada, não há como admitir a ocorrência de controvérsia legítima, mormente após o cancelamento da Orientação Jurisprudencial 351 da SDI-1 do C. TST, de modo a obstar a concessão da multa pretendida. A mera alegação de justa causa não provada não constitui óbice à aplicação do dispositivo legal referido, com o realce de que os valores já eram devidos antes do ajuizamento da reclamatória. Aliás, "O que gera tal direito é a resilição contratual em nada importando a percepção que o reclamado tem dos fatos pois, do contrário, a mera alegação de justa causa - ainda que convicta alegação - sepultaria o direito transferindo ao alvedrio do empregador a paga ou não da referida multa. Ademais a sentença que desacolhe uma alegação de justa causa não cria e nem rompe relação jurídica, apenas reconstitui fatos pretéritos lhe dando roupagem jurídica (imotivada dispensa) imputando os consectários."(RR 693.074, 5a T, dec. unân., julg. 15.10.2003, DJU 31.10.2003, rel. Juiz Convocado João Carlos Ribeiro de Souza). O aresto complementar evidencia demais nuances da espécie, como a questão da comprovação da culpa do empregado - fator de isenção do empregador - ou da não essencialidade em face da percepção que este tem do caso, diante da previsão legal: "RECURSO DE REVISTA. MULTA. JUSTA CAUSA.O fato objetivo da falta de pagamento das verbas rescisórias, ainda que for reconhecida em juízo como devidas, quer em decorrência do reconhecimento da relação de emprego ou da inexistência de justa causa praticada pelo empregado, atrai a multa prevista em lei. O pagamento oportuno de verbas outras que não as rescisórias não exime o empregador da multa de que trata o § 8° do artigo 477 da CLT. O inadimplemento, no termo fixado, constitui em mora o empregador, que só se exime do pagamento da multa decorrente se comprovada culpa do empregado para o atraso." (TST-RR-525767- 1999, 12a Região, julg. 04.09.2002, 1a T, DJU 11.10.2002, Redatora Designada Juíza Convocada Maria de Lourdes Sallaberry) Com essas considerações, nego provimento ao apelo, também neste ponto. Das horas de percurso As horas de trajeto, a teor do § 2° do artigo 58 da CLT, são computadas na jornada de trabalho do empregado, quando o empregador, sediado em local de difícil acesso ou não servido por transporte público regular, fornece a condução entre a residência e o trabalho, "verbis": "§ 2.° O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução." Nesse mesmo sentido, o item I da Súmula 90 do Colendo TST, ora transcrita: "HORAS 'IN ITINERE'. TEMPO DE SERVIÇO. I - O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular, e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho. (ex-Súmula n° 90 - RA 80/78, DJ 10.11.1978)." Ressalto, neste particular, que o "caput"do art. 7° da Constituição Federal eliminou distinção anterior entre trabalhadores urbanos e rurais, conferindo supremacia ao Princípio da Isonomia - desdobramento do Princípio da Igualdade (art. 5°, caput, da CF) - atribuindo maior vigor ao valor social do trabalho e à dignidade humana, princípios que fundamentam o Estado Democrático de Direito. Assim, ao trabalhador rural é aplicável o disposto no art. 58, §2°, da CLT. À reclamada, portanto, incumbia o ônus da prova do fato impeditivo do direito pretendido, mormente porque aduzido, em sede de defesa, que o trajeto era servido por transporte público regular e que os engenhos em que trabalhava o reclamante eram