PODER JUDICIÁRIO Proc. N° 0024376-50.2014.5.24.0007 - RECURSO ORDINÁRIO (1009) RECURSO DE REVISTA Recorrente(s) :1. EDWARD JOSE DA SILVA Advogado(a)(s) :1. Marta do Carmo Taques (MS - 3245) Recorrido(s) :1. ALBUQUERQUE PAES BARBOSA ADVOGADOS ASSOCIADOS 2. SUBCONDOMINIO DO CENTRO COMERCIAL DO SHOPPING CENTER ELDORADO CAMPO GRANDE 3. CONDOMINIO PRO INDIVISO DO SHOPPING CAMPO GRANDE 4. CAMPO GRANDE PARKING LTDA. 5. FUNDO DE PROMO.COLE.DO SHOPPING C.ELDORADO CAMPO GRANDE 6. CONDOMINIO DO SHOPPING CENTER ELDORADO CAMPO GRANDE 7. CONDOMINIO NORTE SUL 8. BR MALLS ADMINISTRACÃO E COMERCIALIZAÇÃO LTDA. Advogado(a)(s) :Wilson Farias do Rego (MS - 16484) Registre-se, inicialmente, que os pressupostos de admissibilidade serão analisados de acordo com os novos parâmetros estabelecidos pela Lei n. 13.015/2014 (publicada no DOU de 22/7/2014, com vigência a partir de 20/9/2014, nos termos do artigo 8°, § 1°, da Lei Complementar n° 95/98), regulamentada pelo Tribunal Superior do Trabalho por meio do Ato n° 491/14. PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Tempestivo o recurso (acórdão publicado em 02/03/2015 - ID 51a4d72 - (Lei 11.419/2006, art. 4°, § 3°); interposto em 10/03/2015 - ID 44f82dd, por meio do sistema PJe-JT. Regular a representação, ID 8d6ccc4. Dispensado o preparo. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS Contrato Individual de Trabalho / Reconhecimento de Relação de Emprego. Alegação(ões): - violação ao(s) artigo(s) 333, II, e 335 do CPC. - violação ao(s) artigo(s) 3° e 818 da CLT. - violação ao(s) artigo(s) 18 da Lei 8.906/1994. - divergência jurisprudencial. Aduz ser inaplicável o disposto no art. 335 do CPC no caso concreto, porquanto há norma jurídica regulando a questão da relação de emprego do advogado, de modo que inexiste fundamento para a afirmação de que o advogado autônomo é a regra e o empregado a exceção. Em consequência, sustenta ser incabível a inversão do ônus da prova. Assere que os réus admitiram os requisitos configuradores do vínculo de emprego, sendo certo que o simples fato da prestação de serviços ser realizada fora das dependências da empresa não descaracteriza a relação empregatícia. Além disso, não ficou comprovado o alegado contrato de parceria informal. Consta do v. acórdão (ID 23ab4ae - Pág. 2-6): 2.1 - VÍNCULO DE EMPREGO - ADVOGADO Insurge-se o autor em face da sentença que não reconheceu o vínculo de emprego. Sustenta não haver fundamento na afirmação de que o advogado autônomo é a regra e o empregado é a exceção. Não se aplica à hipótese, assim, o art. 335 do CPC e, portanto, a inversão do ônus da prova. Desse modo, e não tendo havido a negativa da prestação de serviços, o ônus da prova, nos termos do art. 818 da CLT, é e sempre será do réu, e não do reclamante. Apesar disso, o réu não apresentou prova para demonstrar a inexistência da relação de emprego e comprovar a alegada parceria civil. Além disso, sustenta o autor, não subsistem os critérios indicados pela sentença para negar o vínculo de emprego, pois, no tocante ao local de trabalho, o trabalho do advogado empregado pode ser desempenhado fora das dependências da empresa e, nos termos do art. 6° da CLT, não se distingue o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado. No que tange à subordinação, aduz que, nos termos do art. 7°, XXXII, tratando-se de trabalho intelectual, a liberdade para definir horários de trabalho e elaborar peças jurídicas não tem o condão de descaracterizar o vínculo, pois também é trabalhador subordinado aquele que, no plano intelectual, realiza sem incessantes ordens diretas os objetivos empresariais (subordinação indireta). Tanto é assim que tinha de prestar contas do seu trabalho, apresentando relatórios de tudo que era realizado. Não bastasse, a sentença ignorou a confissão da preposta de que havia remuneração fixa. Baseado nos motivos expostos, pugna o autor pelo reconhecimento da relação de emprego no período de 27.11.1990 a 2.7.2013, com a respectiva anotação em CTPS e, com fundamento no § 3° do art. 515 do CPC, pelo deferimento das comissões não quitadas, horas extras excedentes da 4a diária, RSR, adicional por acúmulo de funções, diferenças salariais decorrentes de redução salarial, férias, FGTS e 13° salário de todo o período, verbas rescisórias, multas dos art. 467 e 477 da CLT, seguro-desemprego, indenização por danos morais e materiais, gratificação semestral e indenização estabilidade. Analiso. O autor alegou na inicial que foi admitido pela 1a ré, Albuquerque Paes Barbosa Advogados Associados, como advogado, sem registro em CTPS, em 27.11.1990, tendo sido dispensado sem justa causa, em 2.7.2013. Que por determinação da 1a ré, desde 27.11.1990 prestou trabalhos jurídicos, administrativos e consultivos para os reclamados Subcondomínio do Centro Comercial do Shopping Center Eldorado Campo Grande, Condomínio Pró Indiviso do Shopping Campo Grande, Campo Grande Parking Ltda, Fundo de Promoções Coletivas do Shopping Campo Grande, Condomínio do Shopping Center Eldorado Campo Grande, BR Malls Administração e Comercialização Ltda, empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, e para o reclamando Condomínio Norte Sul, desde 25.5.2011. Afirmou o autor, ainda, que no desempenho de suas funções realizava a propositura de ações judiciais, defesas judiciais e administrativas, requerimentos administrativos, minutas de contratos cíveis e comerciais, relatórios mensais de ações propostas, elaboração de pautas de audiência, acompanhamento de ações judiciais, acompanhamento em delegacias e outros órgãos públicos, alimentação diária do programa TEDESCO, reuniões semanais na sede da 1a ré e do 2° e 3a réus, além de consultorias por telefone e e-mail. Sustentou, também, que recebia salário mensal no valor de R$ 3.990,00, mais comissões que, em média, totalizavam R$ 7.588,21. Assim, com base na Lei 8.906/94 e no princípio da primazia da realidade, e sob alegação de terceirização ilícita de atividade-fim, o autor requereu a declaração do vínculo empregatício. Os réus, na contestação, alegaram que havia entre a 1a ré e os demais demandados relação de natureza civil, a saber, prestação de serviços advocatícios. A ia ré, por sua vez, não tinha em seu escritório a especialidade trabalhista e buscou no autor um parceiro para atender aos demais reclamados nesta área. Assim, segundo os réus, o autor assumia a responsabilidade pela condução das ações, fixando e partilhando com a ia ré o valor dos honorários. Em relação aos requisitos da relação de emprego, quanto à pessoalidade os réus sustentaram que o autor sempre manteve sob sua responsabilidade o seu escritório e que além do contrato comercial mantido com a 1a ré, presta serviços de advocacia a diversas outras empresas e clientes. Assim, embora tenha atuado pessoalmente, o autor prestou serviços por meio do seu escritório de advocacia, atuando, portanto, como pessoa jurídica, e não física. No tocante à onerosidade, alegaram os réus que o autor não recebia salário nem comissão, mas, sim, honorários dos processos em que atuava, por ele fixados e rateados com a ia ré. E quanto à continuidade, sustentaram que o autor laborava conforme a necessidade de cada ação. Por fim, quanto à subordinação, afirmaram os réus na defesa que não havia interferência no modo como o autor atuava nas ações e que este nunca teve jornada definida, pois trabalhava em seu escritório. Que os deslocamentos e demais atendimentos a clientes se davam conforme a necessidade das ações, como parte da atuação advocatícia, não havendo falar, assim, em cumprimento de ordens. E que a confecção de relatórios de andamento processual e a alimentação do sistema de acompanhamento posteriormente implantando pela ia ré são obrigações próprias da prestação de serviços advocatícios, daí porque não têm o condão de caracterizar subordinação. A sentença, por sua vez, após consignar que a profissão de advogado é presumidamente autônoma, donde se conclui que extraordinário é o trabalho subordinado, atribuiu ao autor o ônus probatório. E não havendo nos autos prova para dar sustentação às alegações da inicial, concluiu o juízo a quo não haver o autor se desincumbido do ônus que lhe competia. Ainda de acordo com a sentença, mesmo se fosse da ré o ônus de comprovar a inexistência do vínculo empregatício, as declarações prestadas pelo autor em seu depoimento evidenciam que não estavam presentes na relação entre as partes os requisitos necessários à caracterização do vínculo. Pois bem. O artigo 818 da CLT estabelece textualmente que "o ônus de provar as alegações incumbe à parte que as fizer". À primeira vista, assim, ao trabalhador incumbe o ônus de comprovar a relação de emprego. Contudo, admitida a prestação de serviços, com fundamento no princípio da aptidão para a prova consagrou-se o entendimento segundo o qual o ônus de demonstrar a ausência dos requisitos que caracterizam a relação de emprego compete ao réu. Isso, contudo, não impede o juiz de, como na hipótese, avaliar a causa, fatos e possíveis provas, a verossimilhança e a hipossuficiência, para, com isso, estabelecer o ônus. No caso, há de se ponderar que a figura do advogado autônomo especializado em uma área específica da advocacia que, para captar clientes, ampliar sua área de atuação e aumentar o grau de informação de mercado, firma parcerias com firmas de advocacia que já têm vários clientes, mas não advogados especializados na área do advogado autônomo, vem se popularizando em nossa prática jurídica. A realidade, portanto, alinha-se ao espírito da Lei 8.906/94 na qual, não obstante regulação da relação de trabalho do advogado empregado, predomina o exercício da advocacia autônoma. Anote-se, por outro lado, que ao reconhecer que a profissão de advogado é presumidamente autônoma, não está o julgador a firmar, inconteste, a incompatibilidade entre o exercício da advocacia e a condição de empregado. Anote-se, outrossim, não se poder negar que, sendo o reclamante advogado com conhecimento jurídico na área trabalhista, possui discernimento necessário para não se deixar intimidar por artifícios usados com o intuito de burlar a legislação trabalhista por cerca de 23 anos. Todas essas ponderações acerca da profissão de advogado e especificidades do caso podem, sim, ser consideradas pelo julgador de modo a estabelecer o ônus da prova. De qualquer modo, registre-se que, via de regra, o ônus da prova é uma regra de julgamento para o caso de ausência ou precariedade da prova. Assim, ausente ou precária a prova, o julgador valer-se-á das regras de distribuição previamente postas para julgar em desfavor da parte a quem incumbia produzi-la. Há de se considerar, por outro lado, que a finalidade da prova, como é sabido, é a formação da convicção do julgador quanto à existência dos fatos, pois é ele, afinal, o destinatário da prova que, portanto, não pertence às partes. Por conseguinte, independentemente de quem tenha produzido a prova, desarrazoado admitir que, se a prova cabia a uma das partes, mas a parte contrária a produziu, o juiz desprezará os fatos conforme provados. E na hipótese, como bem observou o julgador , a quo ainda que o ônus da prova competisse aos réus, o fato é que as declarações prestadas pelo autor afastam o vínculo pretendido. Senão vejamos. O autor, repita-se, advogado com conhecimento jurídico na área trabalhista, deixou claro em depoimento que na contratação não cogitou a celebração de contrato de emprego e que só após dez anos comentou com uma das sócias acerca dessa possibilidade. O autor também admitiu que realizava o trabalho com seus equipamentos, sendo ele próprio quem custeava o material necessário, como papel e tinta. Admitiu, também, que tinha empresas contratadas que faziam o acompanhamento de prazos para ele. Certamente, não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e fora das dependências da empresa, desde que, contudo, caracterizados os pressupostos da relação de emprego. É certo também que em se tratando de serviço de caráter basicamente intelectual, a subordinação se apresenta de forma mais sutil, de modo que a liberdade para definir horários de trabalho e elaborar peças jurídicas, por si só, poderia não descaracterizar o vínculo. Do mesmo modo, a prestação de serviços para outros clientes e, portanto, a ausência de exclusividade, isoladamente, não refuta a existência de vínculo. Contudo, tais evidências, conjugadas com as demais particularidades apontadas, conduz à conclusão de que, ainda que tenha a preposta admitido o pagamento fixo, não se tratava de uma relação de emprego. Registre-se que a alegada apresentação de relatórios constitui obrigação comum a diversas espécies de relações contratuais, daí porque não pode ser tomada como prova de subordinação. Registre-se, por fim, que o fato de não haver contrato formal de parceria também não impede, à luz da primazia da realidade, o reconhecimento da existência da relação. Por todo o exposto, julgo não haver fundamento suficiente para modificar a sentença de origem. Nego provimento. Para o acolhimento da pretensão recursal seria necessário o reexame de fatos e provas, o que encontra óbice na Súmula 126/TST e inviabiliza o seguimento do recurso, inclusive por divergência jurisprudencial. CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. Inclua-se o indicador "Lei 13.015/2014", conforme ofício circular SEGJUD/TST n. 051/2014. Publique-se e intime-se. Campo Grande, 08 de abril de 2015. Nery Sá e Silva de Azambuja Presidente do TRT da 24a Região