PODER JUDICIÁRIO Proc. N° 0024109-88.2014.5.24.0036 - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO (1689) RECURSO DE REVISTA Recorrente(s) :USINA RIO PARANÁ S.A. Advogado(a)(s) :Indalésio Gomes Neto Recorrido(s) :NARCISO FIGUEIREDO VILAR Advogado(a)(s) :Fábio Serafim da Silva (MS - 5363) Registre-se, inicialmente, que os pressupostos de admissibilidade serão analisados de acordo com os novos parâmetros estabelecidos pela Lei n. 13.015/2014 (publicada no DOU de 22/7/2014, com vigência a partir de 20/9/2014, nos termos do artigo 8°, § 1°, da Lei Complementar n° 95/98), regulamentada pelo Tribunal Superior do Trabalho por meio do Ato n° 491/14. PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Tempestivo o recurso (acórdão publicado em 09/12/2014 - ID e930f68 - (Lei 11.419/2006, art. 4°, § 3°); interposto em 15/12/2014 - ID e0bb660, por meio do sistema PJe-JT. Regular a representação, ID's 85bbfaa e 02ce2e1. Satisfeito o preparo (ID 4b991a9, ID 897a23a, ID's 94820c3 e 365be58 e ID d82c433). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Nulidade / Negativa de prestação jurisdicional. Alegação(ões): - violação ao(s) artigo (s) 5°, XXXV, LV, 7°, XXVI, 93, IX, da CF. - violação ao(s) artigo (s) 611, § 1°, 832 da CLT. Sustenta que o Tribunal não se manifestou sobre a existência de instrumento coletivo de trabalho, que prescreve sobre as horas de percurso. Consta do v. acórdão, que decidiu os embargos declaratórios (ID f614807): 2.1 - OMISSÃO - HORAS IN ITINERE Alegando vício de omissão no acórdão, quanto ao deferimento de horas in itinere ao autor, pretende a embargante que seja assentado o teor da cláusula 36a da itinere norma coletiva, que trata do tema, e manifestação deste Egrégio Tribunal frente ao disposto nos artigos 7°, XXVI, da Constituição Federal e 611, § 1°, da CLT. Analiso. O reclamante trabalhava nas lavouras, atuando no plantio, corte e capina de cana-de-açúcar, e a norma coletiva invocada pela reclamada estabelece, para o caso, quanto às horas in itinere: "as partes suscitantes fixam o tempo médio despendido no transporte em 01:00 (uma) hora por dia trabalhado, que deverá ser pago sobre o piso da categoria, não integrando os salários para nenhum efeito contratual e legal, nem será considerado como jornada extraordinária" (cláusula 36a, a, do Acordo Coletivo de Trabalho 2012/2014, ID 5100741, p. 11, grifo nosso). Trata-se de questão devidamente analisada no acórdão, que afastou a validade da negociação, por não ser razoável o tempo médio de trajeto fixado no acordo (1 hora diária) em comparativo com o realmente despendido, comprovado pelas testemunhas (5 horas diárias), além de a norma afastar a integração da parcela ao salário e o seu pagamento como hora extra, contrariando o artigo 58, § 2°, da CLT e a Súmula 90, I, do C. TST, tudo em flagrante prejuízo ao trabalhador, de forma abusiva (ID 897a23a, p. 5-6). Nesse sentido, foi deferido o pagamento do tempo relativo às horas in itinere, com adicional de 50%, e, pela habitualidade, reflexos em outras parcelas, com dedução de valores pagos sob os mesmos títulos. Enfim, a matéria encontra-se devidamente analisada e prequestionada (Súmula 297 do C. TST), e, quanto aos dispositivos de lei e da Constituição Federal invocados, não há necessidade de referência expressa a eles para efeito de prequestionamento (Orientação Jurisprudencial 118 da SDI-1 do C. TST). Rejeito os embargos. Inicialmente, destaca-se que o conhecimento do recurso fica restrito à análise dos dispositivos legais constantes da OJ n° 115, da SDI-1 do TST. Com efeito, o art. 93, IX, da CF determina que as decisões emanadas do Poder Judiciário devem ser fundamentadas. O acórdão recorrido encontra-se devidamente fundamentado, nele constando as razões que levaram o julgador a rejeitar as alegações do réu, restando, pois, atendido o comando constitucional. Impõe-se esclarecer que o juiz não está obrigado a rebater, uma a uma, as teses trazidas pela parte. Seu dever se cinge a apreciar os pedidos formulados e demonstrar os elementos de convicção que o levaram a esta ou aquela solução. Duração do Trabalho / Horas in itinere. Alegação(ões): - violação ao(s) artigo (s) 7°, VI, XIII, XVI, XXVI, da CF. - violação ao(s) artigo (s) 58, § 2°, 611,818 da CLT; 333, I, do CPC. - divergência jurisprudencial. Sustenta que o acórdão negou eficácia às normas autônomas, pois deferiu tempo de percurso superior ao acordado coletivamente. Consta do v. acórdão (ID 897a23a - pág. 4 a 6): 2.2 - HORAS IN ITINERE - DIFERENÇAS Aduz o recorrente que não há aplicar o acordo coletivo, que fixa em uma hora o tempo in itinere, pois alcança somente os trabalhadores residentes em Eldorado/MS, o que não é o seu caso, e são nulas cláusulas que estipulam tempo inferior ao realmente gasto no transporte. Insiste, assim, no pedido de diferenças, nos termos da inicial. Analiso. O fornecimento de condução gratuita aos empregados é fato incontroverso e o local de trabalho é situado na zona rural (o autor foi contratado como empregado rural - CTPS, ID 8f908ed, p. 3), não servida de transporte público, sendo, portanto, de difícil acesso. O autor residia no Município de Tacuru/MS, e a reclamada situa-se na zona rural de Eldorado/MS, não havendo admitir, como pretendido pela reclamada na defesa, que o tempo de trajeto entre os municípios - ida e volta - não pode ser considerado como horas in itinere, em razão de haver "linha regular de ônibus, pela empresa Viação Umuarama" (ID 43497ad, p. 32). O transporte intermunicipal não afasta o direito às horas in itinere, pois não ocorre nos moldes exigidos no artigo 58, § 2°, da CLT e na Súmula 90 do C. TST, uma vez a sua finalidade é diversa, não tendo as mesmas características do transporte público urbano, sobretudo quanto ao valor da passagem e facilidade de acesso. No tocante à fixação do tempo médio por in itinere norma coletiva, aceita-se a negociação (artigo 7°, XXVI, da Constituição Federal), desde que observada a razoabilidade, não discrepando, abusivamente, em prejuízo do trabalhador, o tempo fixado do realmente gasto no deslocamento. No caso, a norma coletiva estabeleceu o pagamento de uma hora por dia de trabalho, a título de horas in itinere (cláusula 36a , a, do Acordo Coletivo de Trabalho 2012/2014, ID 5100741, p. 11). O autor, entretanto, alegou despender 5 horas diárias no trajeto do trabalho, relatando, em média, os seguintes horários: na ida, tomava a condução às 4h15 e chegava ao local de trabalho às 6h45 e, no retorno, saía às 15h45 e chegava às 18h15, o que foi confirmado pela prova testemunhal. Quanto à ida, a testemunha Silvério afirmou que o ônibus pegava os empregados em Tacuru/MS entre 4h00 e 4h20 (ID 483dd80, p. 1). Solange disse que era a última pegar o ônibus, o que ocorria às 4h20 (ID 483dd80, p. 2). E as demais nada disseram a respeito. Admissível, então, a alegação do autor de que saía às 4h15. Sobre a chegada, Silvério disse que ocorria às 6h45/6h50 (ID 483dd80, p. 1), e as demais testemunhas - Solange, Cláudio e Arceleu - afirmaram que se dava, em média às 6h50 (ID 483dd80, p. 2-3). Em relação ao retorno, as testemunhas relataram a saída do ônibus às 15h45, 15h20 e 15h25 (Solange, Cláudio e Arceleu, respectivamente - ID 483dd80, p. 2-3), o que permite acolher o horário alegado na inicial - 15h45 -, e nada falaram sobre a chegada, sendo possível, considerando o mesmo tempo de trajeto da ida, admitir que ocorria às 18h15, como alegou o obreiro. Em resumo, fixo que o tempo de trajeto era de 5 horas diárias, 2 horas e 30 minutos para a ida e o mesmo tempo para o retorno, sendo, na ida, das 4h15 às 6h45 e, na volta, das 15h45 às 18h15. Como dito, é admissível a prefixação do tempo por norma coletiva se for definido tempo médio razoável para as horas de percurso em troca de outros benefícios, o que, no caso, não ocorreu (razoabilidade), pois foi prefixada uma hora por dia quando o tempo real era de cinco horas, discrepância que não permite acolher como válida a negociação, pois evidente o prejuízo para o trabalhador. Também em claro prejuízo aos empregados, vê-se que a norma coletiva estabeleceu que a verba não integraria os salários para nenhum efeito nem seria considerada como hora extra (cláusula 36a, a, do Acordo Coletivo de Trabalho 2012/2014, ID 5100741, p. 11), o que contraria o artigo 58, § 2°, da CLT e a Súmula 90, I, do C. TST. Preenchidos, então, os pressupostos legais para o direito às horas in itinere (artigo 58, § 2°, da CLT e Súmula 90 do C. TST), e como este tempo integra a jornada para todos os efeitos e acarreta sobrelabor, defiro o seu pagamento - cinco horas por dia trabalhado - como horas extras, com adicional de 50%, e, pela habitualidade, reflexos em repousos semanais remunerados, férias + 1/3, gratificação natalina e FGTS. Deverão ser deduzidos os valores pagos sob os mesmos títulos, tudo conforme se apurar na fase de execução. Pelo exposto, dou provimento ao recurso para deferir o pagamento de horas in itinere e reflexos. Inviável o seguimento do recurso neste tópico, ante a conclusão da Turma no sentido de que as horas de percurso somente podem ser negociadas, se houver razoabilidade na fixação do tempo. E é justamente esse o entendimento do Colendo TST, cuja jurisprudência é no sentido de que a pré-fixação do tempo destinado às horas de percurso, em instrumento coletivo, deve guardar razoabilidade e proporcionalidade com o tempo real, sob pena de a negociação traduzir-se em verdadeira renúncia de direito indisponível, o que não é possível. Citam-se os seguintes julgados da SBDI-1 do TST: E-RR - 303¬ 27.2012.5.15.0074 Data de Julgamento: 27/11/2014, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, Data de Publicação: DEJT 05/12/2014; E-RR - 123700-14.2008.5.09.0242 Data de Julgamento: 13/11/2014, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Publicação: DEJT 28/11/2014; E-RR - 668¬ 58.2012.5.09.0459 Data de Julgamento: 13/11/2014, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Publicação: DEJT 21/11/2014. No caso, a demanda coletiva não preservou sequer 50% do tempo gasto com o deslocamento, atraindo sua ilegalidade, segundo o entendimento do Colendo TST. Portanto, os arestos colacionados não constituem divergência apta, nos termos do art. 896, § 4°, da CLT e da Súmula 333 do C. TST. Duração do Trabalho / Intervalo Interjornadas. Alegação(ões): - violação ao(s) artigo (s) 66 e 818 da CLT; 331, I, do CPC; 884 do CC. Sustenta que não houve violação ao tempo de intervalo entre uma e outra jornada. O acórdão acarretou bis in idem, pois foi condenado ao pagamento de horas extras e supostas horas de infração ao intervalo interjornada. Consta do v. acórdão (ID 897a23a, pág. 6): 2.3 - INTERVALO INTERJORNADA Insiste o autor no pagamento do tempo suprimido do intervalo entre uma jornada e outra, a título de horas extras, porque não observado o mínimo legal de onze horas (artigo 66 da CLT). Analiso. Conforme análise do tópico precedente, que agrego a este, o trajeto do autor para o trabalho, reconhecido como horas in itinere, portanto integrante da jornada, era realizado das 4h15 às 6h45 (ida) e das 15h45 às 18h15 (volta). Tem-se, portanto, que o intervalo interjornada era de dez horas - das 18h15 às 4h15 -, de modo que o autor não usufruiu regularmente o tempo mínimo de onze horas entre as jornadas (artigo 66 da CLT), tendo o direito de receber o tempo suprimido como horas extras, nos moldes da Orientação Jurisprudencial 355 da SDI-1 do C. TST. Observada a limitação do pedido (ID d29bbc6, p. 9), defiro o pagamento de 45 minutos por dia trabalhado, como horas extras, com adicional de 50%, e, pela habitualidade, reflexos em repousos semanais remunerados, férias + 1/3, gratificação natalina e FGTS. Pelo exposto, dou provimento ao recurso para deferir o pagamento de horas extras e reflexos, relativas ao intervalo interjornada. Inviável o seguimento do recurso neste tópico, ante a conclusão da Turma no sentido de que as horas de percurso integram a jornada de trabalho e, por consequência, no caso, não foi obedecido o tempo mínimo de fruição de intervalo interjornada. Também se mostra inviável o seguimento do recurso, em relação à alegação de bis in idem , uma vez que a Turma não adotou tese sobre a matéria, à luz dos dispositivos invocados pela recorrente. Ausente o prequestionamento, incide a Súmula 297/TST. CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. Em relação ao pedido constante na peça do apelo (ID e0bb660 - pág. 2): a) habilite-se a advogada, Dra. Simone Marques dos Santos de Freitas, neste feito, pois consta seu credenciamento no PJe- JT, conforme consulta nesse sistema; b) indefiro o pedido de somente os dois advogados nominados permanecerem habilitados, pois para isso seria preciso desabilitar os demais, e estes não realizaram pedido nesse sentido (art. 23, § 4°, da Resolução CSJT 136/2014). À CCP para incluir na capa o indicador "Lei 13.015/2014", conforme ofício circular SEGJUD/TST n. 051/2014. Publique-se e intime-se. Campo Grande, 28 de janeiro de 2015. Des. Nery Sá e Silva de Azambuja Presidente do TRT da 24a Região