Intimado(s)/Citado(s): - EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO Em 10/04/2017, na 3 a Vara do Trabalho de Porto Velho/RO, nos autos da RECLAMAÇÃO TRABALHISTA movida pela reclamante TATIANA PEREIRA DE LIMA em face de EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS, pelo Juíz do Trabalho Substituto Fernando Sukeyosi, foi proferida a seguinte SENTENÇA 1. RELATÓRIO TATIANA PEREIRA DE LIMA, qualificada nos autos, ajuizou em 08/12/2016, ação trabalhista em face da EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS, também qualificada, alegando, em síntese, que a agência em que trabalha foi assaltada no dia 15/09/2016 por três elementos, que entraram no estabelecimento armados e que efetuaram aproximadamente 10 disparos em direção ao balcão da reclamada, mas que por sorte não atingiram ninguém. Relata que a reclamada funciona como correspondente bancário, executando as mesmas funções de um banco, mas que não tem condições mínimas de segurança em suas agências. Aduz que sofreu abalos de ordem psicológica, pelo que se encontra em acompanhamento psicológico, fazendo uso de medicamentos de controle especial, ficando, inclusive, afastada de suas atividades laborativas. Em razão disso, pleiteia a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais. Deu à causa o valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais). Juntou documentos. Presentes as partes em audiência. Defesa escrita, acompanhada de documentos, sobre os quais a autora se manifestou oralmente. Foi colhido depoimento pessoal da autora, do preposto da reclamada e ouvida uma testemunha. Sem mais provas a serem produzidas, declarou-se encerrada a instrução processual. Razões finais remissivas pelas partes. Propostas conciliatórias rejeitadas. É o breve relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO ILEGITIMIDADE PASSIVA. A reclamada suscitou, em sede de preliminar, ser parte ilegítima para figurar no presente processo, afirmando que o fato gerador da indenização que ora se busca tem por causa uma prática criminosa que cabe ao Estado reprimir, por ser sua a responsabilidade pela segurança pública. Sem razão. A legitimidade passiva corresponde à pertinência subjetiva da ação, devendo ser aferida, segundo a teoria da asserção, no plano lógico- abstrato, à luz das afirmativas feitas pela parte reclamante, independente das razões da contestação e das provas constantes dos autos. Assim, basta a indicação pela autora que a empresa reclamada é juridicamente responsável para estar no polo passivo da ação, uma vez que a relação jurídica processual não se confunde com a material. Rejeito, portanto, a preliminar levantada. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Pleiteia a autora indenização por danos morais no montante de R$50.000,00, em razão de ter tido seu psicológico abalado após a ocorrência de um assalto na agência em que trabalha. Alega, para tanto, que embora a reclamada execute as mesmas funções de um banco, não possui condições mínimas de segurança, como portas giratórias ou outros mecanismos para inibir os alvos de ações criminosas. Insurgindo-se contra o pedido da autora, a reclamada pautou sua defesa na alegação de inexistência de responsabilidade de sua parte, na ausência de nexo causal e na presença da excludente de ilicitude - força maior. Sustentou que é dever do Estado prestar segurança pública e que está desobrigada a cumprir a Lei 7.102/1983, pois não é enquadrada como instituição financeira, mas que ainda sim vem estruturando as suas unidades e investindo em segurança. Sustentou, também, que a questão deve ser analisada à luz da responsabilidade subjetiva, vez que a atividade do reclamante, por imperativo legal, não é considerada atividade de risco. Por fim, como tese subsidiária, pugnou, caso acolhida a inicial, que a fixação do quantum indenizatório obedeça aos parâmetros da razoabilidade. Analisa-se. Conforme se extrai das provas constantes nos autos, em especial os depoimentos colhidos e o Boletim de Ocorrência juntado (ID. 3030899), verifica-se que o assalto mencionado pela reclamante de fato ocorreu em 15/09/2016, estando ela efetivamente trabalhando na agência no dia do evento. Portanto, sendo incontroverso que houve o assalto e que a reclamada estava trabalhando na agência na ocasião, a problemática a ser analisada por este juízo circunda na responsabilidade civil da reclamada pelo episódio descrito na exordial. É inegável que a questão relativa à segurança pública é obrigação do Estado, conforme expressamente consagrado no art. 144 da Carta Maior. Todavia, não se pode atribuir unicamente ao Estado a responsabilidade pela segurança dos empregados no local de trabalho, uma vez que a mesma norma que assim anuncia também prevê que a segurança pública é direito e responsabilidade de todos. Ademais, contrariamente à argumentação apresentada pela reclamada, o fato de esta movimentar numerários, ainda que não se possa equipará-la a agência bancária, por si só já autoriza a aplicação das medidas previstas na Lei 7.102/83, sendo irrelevante, portanto, a mencionada Lei não citar os estabelecimentos que atuam como correspondentes bancários. O fato é que a ampliação do campo de atuação nas agências da reclamada passou a gerar um risco maior a seus empregados, o que demanda a adoção de medidas por parte daquela para reduzir os riscos decorrentes de suas atividades, protegendo seus empregados e proporcionando a eles um ambiente de trabalho física e psicologicamente saudável. No presente caso, ficou demonstrado nos autos que a reclamada não adota todas as medidas necessárias à segurança previstas na Lei 7.102/83. Ao ser ouvido, o preposto da reclamada confessou: "que não há porta giratória na agência que a reclamante trabalha; que a agência que a reclamante trabalha funciona como correspondente bancário " . Nesse mesmo sentido foi o depoimento da testemunha da reclamante, Sr. Admilson de Oliveira Ribeiro: "que confirma que na agência tem um vigilante armado, sistema de câmeras e alarmes, porém não há porta giratória; que pelo que sabe o depoente nenhuma agência dos Correios possui porta giratória". De igual sorte, rechaça-se a tese de que haveria excludente de responsabilidade ante a ocorrência de força maior, vez que por interpretação literal do parágrafo único do art. 393 do Código Civil "o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir ". No presente caso, observada as peculiaridades das atividades de correspondente bancário, em especial a movimentação de valores, tem-se maior probabilidade de ocorrência de furtos e roubos, aumentando, assim, o risco da atividade e implicando, por consequência, a obrigação da adoção de medidas eficientes de segurança pelo empregador, a fim de cumprir seu dever, que é o de fornecer um ambiente de trabalho seguro para o trabalhador. Portanto, o fato deixa de ser imprevisível e inevitável, não havendo, assim, que se falar em força maior ou caso fortuito para afastar a responsabilidade da reclamada. De qualquer forma, independentemente de culpa da reclamada por omissão, mormente por não instalar portas com detectores de metais em suas agências, é de se reconhecer que a atividade econômica explorada pela reclamada consiste em atividade de risco para o evento sofrido pela autora, a atrair a aplicação da responsabilidade civil objetiva. Nesse ponto, na forma do caput do art. 7° da Constituição Federal, do parágrafo único do art. 927 do Código Civil e dos arts. 2° e 8° da CLT, nos casos de comprovada atividade de risco do empregador, como é o caso dos autos, aplica-se a responsabilidade civil objetiva, ou seja, resta devida a reparação independente de prova acerca da conduta culposa da reclamada. Nesse sentido vem sendo o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 14 a Região, consoante ementa a seguir transcrita: "ASSALTO A AGENCIA DOS CORREIOS. CORRESPONDENTE DE SERVICOS BANCARIOS. IN S U FICIE N CIA DE EQUIPAMENTOS DE SEGURANCA. NEGLIGENCIA. TEORIA DO RISCO DA ATIVIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA E OBJETIVA. DANO MORAL DEVIDO. Ao passar a exercer atividades de correspondente bancário, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), passou também a movimentar grandes quantidades de dinheiro em suas agencias. Logo, os riscos provenientes de acoes criminosas como assaltos, por exemplo, foram intensificados. Assim, ao não propiciar suficientes medidas de segurança para coibir ou evitar a ocorrência de crimes, age a empresa re com negligencia, incorrendo na responsabilidade civil subjetiva, com culpa, devendo indenizar as vitimas de assalto em seus estabelecimentos. Ademais, resta configurada também a responsabilidade objetiva introduzida pelo art. 927, paragrafo único, baseada na teoria do risco, independentemente de culpa, tendo em vista os perigos potenciais das atividades da ECT, que continuamente permanecem em contato com numerários, não podendo o trabalhador assumir os riscos do empreendimento. (RO 0000231-07.2016.5.14.0081, TRT 14 a , Relatora: Maria Cesarineide de Souza Lima, Data do julgamento: 21/02/2017, data de publicação: 27/02/2017)." (grifei) Destaca-se que a gravidade do fato ocorrido é suficiente para caracterizar o dano moral in re ipsa aferido a partir de um padrão social médio, razão pela qual desnecessária a prova do dano em si. Nada obstante, embora desnecessária a prova, é importante ressaltar que a reclamante juntou aos autos diversos documentos que atestam que sua saúde mental foi abalada após o infortúnio na agência em que trabalha. Vieram aos autos Comunicação de Acidente do Trabalho (ID. ba8c324), em que consta o afastamento da autora por 30 dias e traz como situação geradora da doença o assalto ocorrido. Foram juntados, ainda, atestado médico psiquiátrico afirmando a necessidade de afastamento da autora do trabalho por motivo de doença, encaminhamento ao psicólogo (ID. fb75ad8) e receituário de medicamento de controle especial (ID. b508e60). Destarte, seja pela culpa da reclamada na omissão de adotar todas as medidas de segurança para evitar assaltos (ausência de portas com detectores de metais), seja pela teoria da responsabilidade civil objetiva, tendo em vista a atividade de risco desenvolvida pela reclamada (correspondente bancário), e, uma vez caracterizado o dano moral, e sendo patente o nexo causal, subsiste o dever de indenizar, na forma dos artigos 5°, X e V da CF/88 c/c 186, 187 e 927 do Código civil. Nesses termos, presentes os elementos ensejadores da reparação civil, julgo procedente o pedido de indenização e condeno a reclamada ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de compensação por danos morais. O valor arbitrado leva em consideração os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a extensão e repercussão do dano, capacidade econômica do agente, função pedagógica e compensatória da indenização. Correção monetária e juros de mora do dano moral na forma na súmula 439 do TST. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. Diante da declaração da parte autora, presentes os requisitos legais, defiro a gratuidade de justiça prevista no art. 790, § 3° da CLT. EQUIPARAÇÃO DA RECLAMADA À FAZENDA PÚBLICA. Requer a reclamada sejam observados quanto a ela os privilégios da Fazenda Pública (custas, depósito recursal, prazos, impenhorabilidade de bens, aplicação de juros, dentre outros). Tendo em vista o teor do item II da OJ 247 do TST, que assegura à reclamada as prerrogativas processuais da Fazenda Pública, bem como o contido no art. 12 do Decreto-Lei n° 509/69, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, defiro o que se requer, com exceção aos juros de mora de meio por cento ao mês, vez que o art. 1° F da Lei 9.494/97 foi declarado inconstitucional pelo STF, na ADI 4.357 e o regramento regente de tal disposição prevê juros de mora de 1% a partir do ajuizamento da ação (§1° do art. 39 da Lei 8.177/91 e art. 883 da CLT). 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, na RECLAMAÇÃO TRABALHISTA movida pela reclamante TATIANA PEREIRA DE LIMA em face de EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS , nos termos da fundamentação que passa a integrar este dispositivo, DECIDO : REJEITAR a preliminar de ilegimitidade passiva. JULGAR PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados pela reclamante para condenar a reclamada, nos termos do art. 487, I do CPC, a pagar-lhe: a) indenização por danos morais no importe de R$10.000,00 (dez mil reais). Ainda, defiro à reclamada as prerrogativas processuais de Fazenda Pública, à exceção dos juros de 0,5%, pelos motivos expostos na fundamentação. Improcedentes os demais pedidos.