Movimentação do processo 2017/0032876-7 do dia 26/06/2017
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- Diário Oficial
- 26/06/2017 | STJ - Padrão
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- Estado
- Brasil
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- Processo
- 2017/0032876-7
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- Recorrente
- L da S e S
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- Recorrido
- T F da S MENOR
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- Repr. por
- T F A
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- Advogado
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- Advogado
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- Viviane Cristina Quirino (S) e outros
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- Relator
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- Raul Araújo MINISTRO
Conteúdo da movimentação
Os processos abaixo relacionados encontram-se com Vista ao Agravado para Impugnação do
AgInt:
DECISÃO
Trata-se de recurso ordinário interposto por L. de S. e S. em habeas corpus preventivo
no qual se aponta como autoridade coatora, o il. Juízo da 3ª Vara de Família da Regional de Santa
Cruz/RJ.
Historiam os autos que T. F. da S., representado por sua genitora, propôs ação de
execução de alimentos em desfavor do ora recorrente, na qual foi determinado o pagamento das
prestações alimentares inadimplidas, sob pena de prisão pelo prazo de 30 (trinta) dias.
Na exordial do writ , o então paciente, ora recorrente, informa que efetuou depósitos
(fls. 04) na conta bancária da genitora do alimentando, no valor de R$2.650,00 (dois mil, seiscentos e
cinquenta reais) e, até a data da propositura deste mandamus , o il. Magistrado de piso não teria se
manifestado acerca do pagamento.
Afirma, também, na exordial do remédio heroico, que a omissão do il. Magistrado de
piso em analisar o pagamento acarreta no risco iminente de prisão do paciente, o que motivou a
impetração do presente habeas corpus preventivo.
O em. Desembargador Relator deferiu liminar, reconhecendo a transferência bancária
no valor de R$2.650,00 (dois mil, seiscentos e cinquenta reais).
Sobreveio ofício (fls. 26) da autoridade apontada como coatora, informando que " há
saldo devedor no valor de R$2.823,72 (dois mil, oitocentos e vinte e três reais e dois centavos) ",
apresentando planilha (fls.27).
Por sua vez, eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) denegou a
ordem, nos termos do v. acórdão assim ementado (fl. 33):
"HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. ARTIGO 733 DO CPC.
PRISÃO LASTREADA NO ARTIGO 5 o , LXVII, DA CF. DÉBITO NÃO
ADIMPLIDO NA TOTALIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
CONFIGURADO.
1. Habeas Corpus impetrado sob alegação de quitação do débito alimentar.
2. Juízo a quo que apontou a existência de saldo devedor.
3. Depósito que não alcança sequer metade do valor exequendo.
4. Consolidou-se o entendimento de que sob o rito do artigo 733 do CPC, que
prevê a prisão do alimentante, só pode ser executada dívida recente,
relativa aos últimos três meses vencidos no ajuizamento da execução e as que
se vencerem em seu curso, como no caso em comento.
5. Inexistência de ilegalidade no ato, uma vez que o devedor não comprovou o
cumprimento da obrigação assumida.
6. Remédio heroico a que nega acolhimento."
Inconformado, L. de S. e S. manejou o presente recurso ordinário, no qual alega que
"(...) informado sobre a desatualização do valor, o Recorrente soube, que o Mandado não seria
suspenso até a sua atualização. O Mandado foi expedido no valor de R$ 2.647,36, os depósitos
foram feitos nos dias 09/11/2016 e 10/11/2016 no valor total de R$ 2.650,00. A atualização foi
realizada após o pagamento do valor cobrado no Mandado, teve seu valor definido pela declaração
da Representante legal menor. Foi desconsiderado pelo juízo o pedido de levantamento dos valores
já depositados na conta-corrente, já mencionada (fls. 44).
Assevera que "(...) mesmo estando em situação financeira desfavorável o Recorrente,
pretende quitar seus débitos, inclusive os valores os remanescentes, caso existam. Porém será
necessária a devida atualização dos valores. Seguem anexos alguns comprovantes de depósitos,
efetuados na conta da Representante Legal" (fls. 44).
Instado a se manifestar, o d. Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do
recurso, nos termos do parecer, da lavra do em. Subprocurador-Geral da República, Dr. Pedro
Henrique Távora Niess .
Em petição à fl. 81, L. de S. e S., de profissão autônomo, reitera que tem interesse em
quitar o débito alimentar e que "(...) solicitou o levantamento dos valores depositados na conta
corrente da Representante legal, como também a devida apresentação da atualização dos valores,
devendo respeitar os depósitos, que foram realizados" (fl. 81).
É o relatório. Passo a decidir.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVIII, assim dispõe acerca do presente writ ,
in verbis :
"Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção,
por ilegalidade ou abuso de poder."
Prestigiando a referida norma, deve-se salientar, inicialmente, que o habeas corpus
não é a via adequada para se discutir a obrigação nem a capacidade de prestar alimentos, mas tão
somente para analisar a legalidade do constrangimento à liberdade de ir e vir do paciente, ora
recorrente.
Assim sendo, o remédio constitucional tem por objetivo e limite a proteção da
liberdade de locomoção do indivíduo, quando ameaçada ou suprimida por ato ilegal ou abusivo.
Analisando a legalidade do mandado prisional ora questionado, o eg. TJ-RJ assim se
manifestou (fls. 33-34):
"Trata-se de execução de alimentos buscando a satisfação de crédito
alimentar inadimplido, abrangendo os meses de setembro de 2014 a novembro
de 2016.
Embora o impetrante afirme estar adimplido o valor exequendo, o Juízo a
quo informou a existência de saldo devedor.
Ademais, deve ser pontuado que, inobstante ciente de seu dever de
sustento da prole, durante dois anos efetuou apenas três depósitos que não
alcançam sequer a metade do débito.
Outro remédio não há a fim de compelir o provedor a cumprir com sua
obrigação basilar de sustentar a prole.
Ressalta-se que o limite de três meses, assentado na jurisprudência, não
afasta o pagamento das pensões que se venceram durante o curso da execução.
Nesse sentido, a Súmula 309 do STJ:
'O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que
compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução
e as que se vencerem no curso do processo.'
Inexiste, portanto, qualquer ilegalidade na decisão e a concessão da
ordem demonstraria flagrante benesse ao descumpridor de suas obrigações
de sustento da prole.
Por tais fundamentos, voto em denegar a ordem e cassar a liminar
deferida."
(grifou-se)
Nesse panorama, infere-se que a inadimplência é incontroversa, reconhecida pelo
próprio recorrente, como se depreende das seguintes razões postas no presente recurso ordinário:
"Cabe a parte credora, comprovar o não recebimento dos valores
devidos. Nesse caso o próprio defensor poderia ter solicitado, tal detalhamento,
para calcular a atualização. Sem a informação referente aos depósitos
realizados, qual teria sido o parâmetro para o cálculo da atualização? Apenas
as informações da Representante legal? É possível verificar sua assinatura em
cada página da planilha apresentada (anexa). Portanto não existe segurança
jurídica no valor da atualização apresentada.
(...)
Mesmo estando em situação financeira desfavorável o Recorrente,
pretende quitar seus débitos, inclusive os valores os remanescentes, caso
existam. Porém será necessária a devida atualização dos valores. Seguem
anexos alguns comprovantes de depósitos, efetuados na conta da Representante
Legal." (fls. 44)
Por sua vez, as justificativas ora apresentadas dependem de detalhada revisão
probatória, o que é inviável na estreita via do presente writ , o qual deve vir acompanhado de prova
pré-constituída, não comportando dilação probatória. Nessa linha de intelecção, destacam-se os
seguintes julgados:
"HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. OBRIGAÇÃO
ALIMENTAR. CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE.
AFERIÇÃO. INADMISSIBILIDADE NA VIA ELEITA. ORDEM
DENEGADA.
1. É incompatível com a via do habeas corpus a aferição da real
capacidade financeira do alimentante em prosseguir com o pagamento da
pensão alimentícia, já que, por possuir cognição sumária, não comporta
dilação probatória, tampouco admite aprofundada análise de fatos e
provas controvertidos.
2. O pagamento parcial do débito não afasta a possibilidade de prisão civil
do devedor de alimentos (RHC 26.132/RJ, relator Ministro Vasco Della
Giustina; RHC 24.236/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi; RHC
2.3364/MG, relator Ministro João Otávio Noronha).
3. Ordem denegada." (HC 170.688/SP, Rel. Min. MARIA ISABEL
GALLOTTI , QUARTA TURMA, DJe de 3/8/2011)
"RECURSO ORDINÁRIO CONHECIDO COMO HABEAS CORPUS
SUBSTITUTIVO. EXAME DA CAPACIDADE FINANCEIRA DO
PACIENTE. IMPOSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DAS PRESTAÇÕES
ALIMENTARES. VERIFICAÇÃO PREJUDICADA.
I - Possibilidade de conhecimento de recurso ordinário intempestivo como
habeas corpus substitutivo. Precedentes.
II - Admitindo somente provas pré-constituídas, é inviável, em sede de
habeas corpus , o exame da capacidade financeira do paciente, cuja real
aferição exige a dilação probatória. Precedentes.
III - A verificação da prescrição das prestações alimentares não pode ser
realizada sem o conhecimento da data do seu vencimento e da propositura
da execução.
IV- ORDEM DENEGADA." (RHC 27.290/MG, Rel. Min. PAULO DE
TARSO SANSEVERINO , TERCEIRA TURMA, DJe de 2/3/2011)
Registre-se, ainda, que o entendimento ora adotado corrobora com o posicionamento
do d. Parquet Federal, de cujo irretocável parecer se decalca o seguinte excerto, adotando-o na
presente motivação (fls. 76-77):
"Inicialmente, ressalte-se que o habeas corpus não comporta dilação
probatória, como bem consignado pela douta Procuradoria Geral de Justiça
do Estado, quando da sua manifestação pela denegação da ordem:
'Ab initio, faz-se necessário esclarecer que constitui o habeas corpus
ação de natureza constitucional com vista a tutelar o direito à
liberdade de ir e vir em face de lesão ou ameaça a este por ilegalidade
ou abuso de poder. Como tal, não admite dilação probatória em seu
procedimento, sendo imprescindível que lhe acompanhem, já no
momento de sua impetração, provas pré- constituídas de modo a
ensejar a concessão da ordem.
Portanto, in casu, limita-se o instrumento a verificar a legalidade ou
não da ordem de prisão a que se submete o Paciente, mediante análise
dos documentos, de pronto, carreados aos autos.
Importante registrar que a prisão civil é exceção prevista no art. 5º,
LXVII, da Constituição da República e art. 528, §§ 3º ao 7º, NCPC,
sendo a última conduta a ser utilizada pelo juiz para compelir o
devedoralimentante a pagar o que deve ao alimentando, sendo medida
excepcional e restritiva às três últimas prestações vencidas à data
ajuizamento da execução e as vincendas durante o processo.
Compulsando-se os autos, verifica-se que o ora paciente realizou três
depósitos nos dias 09 e 10/11, totalizando o valor de R$ 2.650,00.
Ocorre quenão há nenhuma comprovação de que seja esse o valor
atualizado do débito alimentar.
Destarte, o presente instrumento carece de alicerce, motivo pelo qual
a decisão emanada pela ilustre autoridade coatora deve ser mantida,
com a consequente denegação da ordem.
Saliente-se que o direito de ir e vir esbarra no direito à vida digna, e,
deste modo, na ponderação dos mesmos, deve prevalecer o segundo.
Ante o exposto, oficia esta Procuradoria de Justiça pela cassação da
liminar deferida e a consequente denegação da ordem'.
Assim, tendo o magistrado a quo informado, à fl. 26, que há saldo
devedor no valor de R$ 2.823,72 (dois mil e oitocentos e vinte e três reais e
setenta e dois centavos), o presente remédio heroico não é a via adequada para
a discussão trazida aos autos.
Ademais, os argumentos do recorrente em relação ao pagamento parcial
do débito e à incapacidade financeira destoam da orientação firmada nesse E.
Sodalício:
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO.
PRISÃO CIVIL. ALIMENTOS PRESTADOS DE FORMA PARCIAL.
ORDEM DENEGADA.
1. O pagamento parcial do débito não afasta a regularidade da prisão
civil.
2. O 'habeas corpus' possui cognição sumária, não comporta dilação
probatória, tampouco admite aprofundada análise de fatos e provas
controvertidos.
3. Não demonstrada em que consiste a pretensa ilegalidade da prisão
decretada pelo inadimplemento de verba de natureza alimentar, deve
a ordem de "habeas corpus" ser negada.
4. HABEAS CORPUS DENEGADO. (HC 304072/SP, Rel. Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, Dje 23/4/2015)
(...)."
Nesse cenário, forçoso reconhecer que o presente apelo não merece prosperar.
Ante o exposto, com fulcro no art. 34, XVIII, do RISTJ, nego provimento ao recurso
ordinário em habeas corpus .
Publique-se.
Brasília (DF), 21 de junho de 2017.
MINISTRO RAUL ARAÚJO
Relator
Confirma a exclusão?