Seção: Secretaria do Tribunal Pleno, do Órgão Especial e da Seção Especializada em Dissídios Coletivos - Acórdão
Intimado(s)/Citado(s): - SINDICATO DO COMERCIO ATACADISTA DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL E OUTROS
- SINDICATO DO COMÉRCIO VAREJISTA DE VEÍCULOS E DE
PEÇAS E ACESSÓRIOS PARA VEÍCULOS NO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL (SINCOPEÇAS)
- SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMÉRCIO DE SANTO
ÂNGELO
- SINDICATO INTERMUNICIPAL DAS CONCESSIONÁRIAS E
DISTRIBUIDORES DE VEÍCULOS NO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
A C Ó R D Ã O SDC KA/ks/pr DISSÍDIO COLETIVO. RECURSO ORDINÁRIO. SINDICATO DO
COMÉRCIO ATACADISTA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO
SUL, SINDICATO INTERMUNICIPAL DO COMÉRCIO VAREJISTA
DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS DO ESTADO DO RIO GRANDE
DO SUL, SINDICATO DO COMÉRCIO VAREJISTA DE
PRODUTOS FARMACÊUTICOS NO ESTADO DO RIO GRANDE
DO SUL, SINDICATO DO COMÉRCIO VAREJISTA DE MATERIAL
ÓPTICO, FOTOGRÁFICO E CINEMATOGRÁFICO DO ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL, SINDICATO DOS
ESTABELECIMENTOS DE SERVIÇOS FUNERÁRIOS DO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E SINDICATO DO
COMÉRCIO ATACADISTA DE ÁLCOOL E BEBIDAS EM GERAL
NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. FALTA DO MÚTUO
ACORDO. ARTIGO 114, § 2°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE
1988. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO . Com a edição da Emenda Constitucional n° 45/2004,
estabeleceu-se novo requisito para o ajuizamento de dissídio
coletivo de natureza econômica, qual seja, que haja comum acordo
entre as partes. Trata-se de requisito constitucional para
instauração do dissídio coletivo e diz respeito à admissibilidade do
processo. A expressão "comum acordo", de que trata o mencionado
dispositivo constitucional, não significa, necessariamente, petição
conjunta das partes, expressando concordância com o ajuizamento
da ação coletiva, mas a não oposição da parte, antes ou após a sua
propositura, que se pode caracterizar de modo expresso ou tácito,
conforme a sua explícita manifestação ou o seu silêncio. No caso
dos autos, houve a recusa expressa quanto à instauração do
dissídio coletivo, a qual foi feita em momento oportuno, o que
resulta na extinção do processo, sem resolução de mérito, em
relação aos recorrentes, ante a falta de pressuposto de constituição
e de desenvolvimento válido e regular. Recurso ordinário provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n°
TST-RO-20686-89.2014.5.04.0000 , em que é Recorrente
SINDICATO DO COMERCIO ATACADISTA DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL E OUTROS e são Recorridos SINDICATO DOS
EMPREGADOS NO COMÉRCIO DE SANTO ÂNGELO,
SINDICATO DO COMÉRCIO VAREJISTA DE VEÍCULOS E DE
PEÇAS E ACESSÓRIOS PARA VEÍCULOS NO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL (SINCOPEÇAS) e SINDICATO
INTERMUNICIPAL DAS CONCESSIONÁRIAS E
DISTRIBUIDORES DE VEÍCULOS NO ESTADO DO RIO GRANDE
DO SUL . O Sindicato dos Empregados no Comércio de Santo Ângelo ajuizou
dissídio coletivo contra o Sindicato do Comércio Atacadista do
Estado do Rio Grande do Sul e Outros.
O Tribunal Regional do Trabalho da 4 a Região rejeitou a preliminar
de ausência de comum acordo para o ajuizamento do dissídio
coletivo ajuizado pelo Sindicato do Comércio Atacadista do Estado
do Rio Grande do Sul, Sindicato Intermunicipal do Comércio
Varejista de Gêneros Alimentícios do Estado do Rio Grande do Sul,
Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos no
Estado do Rio Grande do Sul, Sindicato do Comércio Varejista de
Material Óptico, Fotográfico e Cinematográfico do Estado do Rio
Grande do Sul, Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços
Funerários do Estado do Rio Grande do Sul e Sindicato do
Comércio Atacadista de Álcool e Bebidas em Geral no Estado do
Rio Grande do Sul. No mérito, a Corte regional julgou parcialmente
procedentes as reivindicações da categoria profissional, consoante
os termos do acórdão de fls. 533/584.
Sindicato do Comércio Atacadista do Estado do Rio Grande do Sul,
Sindicato Intermunicipal do Comércio Varejista de Gêneros
Alimentícios do Estado do Rio Grande do Sul, Sindicato do
Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos no Estado do Rio
Grande do Sul, Sindicato do Comércio Varejista de Material Óptico,
Fotográfico e Cinematográfico do Estado do Rio Grande do Sul,
Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços Funerários do Estado
do Rio Grande do Sul e Sindicato do Comércio Atacadista de Álcool
e Bebidas em Geral no Estado do Rio Grande do Sul interpuseram
recurso ordinário (fls. 590/619), que foi admitido pelo despacho de
fls. 635/636.
Contrarrazões apresentadas pelo Sindicato dos Empregados no
Comércio de Santo Ângelo, às fls. 643/664.
Dispensada nova remessa à Procuradoria-Geral do Trabalho, nos
termos do art. 83, IV, do RI do TST, haja vista haver parecer
exarado pela Procuradoria Regional (fls. 514/519).
É o relatório.
V O T O O TRT rejeitou a preliminar de falta de comum acordo para a
instauração do dissídio coletivo.
Sindicato do Comércio Atacadista do Estado do Rio Grande do Sul,
Sindicato Intermunicipal do Comércio Varejista de Gêneros
Alimentícios do Estado do Rio Grande do Sul, Sindicato do
Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos no Estado do Rio
Grande do Sul, Sindicato do Comércio Varejista de Material Óptico,
Fotográfico e Cinematográfico do Estado do Rio Grande do Sul,
Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços Funerários do Estado
do Rio Grande do Sul e Sindicato do Comércio Atacadista de Álcool
e Bebidas em Geral no Estado do Rio Grande do Sul interpuseram
recurso ordinário contra a decisão do Tribunal Regional, renovando
a questão da falta do mútuo consenso para o ajuizamento da
representação coletiva.
Os recorrentes sustentam, em síntese, que manifestaram
discordância do ajuizamento do dissídio coletivo, de modo que é
cabível a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Os recorrentes têm razão, segundo a jurisprudência desta Corte.
Dispõe o art. 114, § 2°, da Constituição Federal, com redação
conferida pela Emenda Constitucional n° 45/2004, in verbis :
"Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
(...)
§ 2° Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à
arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar
dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do
Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas
legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas
anteriormente."
Assim, com a edição da Emenda Constitucional n° 45/2004,
estabeleceu-se novo requisito para o ajuizamento da ação coletiva
de natureza econômica, qual seja, que haja comum acordo entre as
partes.
E, conforme entendimento atual desta Corte, o comum acordo é
requisito constitucional para instauração do dissídio coletivo e diz
respeito à admissibilidade do processo. É questão prévia, precede
ao ajuizamento da ação, e, como pressuposto de constituição do
processo, antecede o exame das demais preliminares, inclusive a
de legitimidade de parte, que só pode ser enfrentada após superado
esse óbice.
A expressão "comum acordo", de que trata o mencionado
dispositivo constitucional, não significa, necessariamente, petição
conjunta das partes, expressando concordância com o ajuizamento
da ação coletiva, mas a não oposição da parte, antes ou após a sua
propositura, que se pode caracterizar de modo expresso ou tácito,
conforme a sua explícita manifestação ou o seu silêncio.
No caso, verifica-se que em preliminar de contestação (fls.
378/444), houve a recusa expressa dos recorrentes quanto à
instauração do dissídio coletivo, no momento oportuno, o que
resulta na extinção do processo, sem resolução de mérito, ante a
falta de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e
regular do processo.
Esclareço que, conforme entendimento pacífico nesta Corte
Superior, não há conflito entre a exigência de "comum acordo",
como requisito para instauração do dissídio coletivo, e o disposto no
art. 5°, XXXV, da Constituição Federal, já que esse dispositivo
garante o direito à manifestação jurisdicional acerca de possíveis
afrontas a direitos previstos em normas jurídicas preexistentes,
enquanto que no dissídio coletivo a atuação estatal se traduz pela
criação das normas jurídicas que visam à pacificação do conflito,
em pleno exercício do poder normativo conferido
constitucionalmente à Justiça do Trabalho.
Por outro lado, há de se compreender a exigência do comum
acordo vinculado à concepção de estímulo à negociação coletiva,
considerando a primazia das soluções autônomas para as
controvérsias, devendo ser utilizada com boa fé pelas partes
envolvidas no conflito, de modo a cumprir o comando constitucional
e assegurar a justiça.
Cito como precedente, que esclarece o entendimento desta Seção:
"DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA E
REVISIONAL. EXIGÊNCIA DE COMUM ACORDO.
MANIFESTAÇÃO CONTRÁRIA EM DEFESA. 1. O art. 114, § 2o, da
Constituição Federal, com a redação dada pela EC n° 45/2004,
dispõe que, recusada a negociação coletiva ou a arbitragem, faculta
-se às partes, de comum acordo, o ajuizamento de dissídio coletivo
de natureza econômica. 2. Tal dispositivo não padece de
inconstitucionalidade frente ao art. 5°, inciso XXXV, da Constituição
Federal, pois referido dispositivo, ao impedir que se vede o acesso
ao Poder Judiciário, diz respeito às lesões a direitos subjetivos
decorrentes de normas jurídicas preexistentes, situação muito
diversa do dissídio coletivo, em que a pretensão dirige-se à criação
de normas jurídicas. De todo modo, a Constituição Federal não
consagra um direito irrestrito e incondicionado de mero acesso ao
Poder Judiciário, podendo a lei prever requisitos, condições e
pressupostos para tanto, tal como se dá, por exemplo, com o
exaurimento da negociação coletiva prévia no dissídio coletivo
(CLT, art. 616, § 4°). 3. Se em defesa há manifestação expressa de
discordância no ajuizamento de dissídio coletivo, impõe-se a
extinção do processo, sem resolução de mérito (CPC, art. 267,
inciso IV). 4. Recurso ordinário interposto pela Empresa Suscitada a
que se dá provimento." (Processo: RODC - 354200-72.2005.5.04.0000
Data de Julgamento: 13/09/2007, Relator
Ministro: João Oreste Dalazen, Seção Especializada em Dissídios
Coletivos, Data de Publicação: DJ 26/10/2007)
No mesmo sentido, leciona Carlos Henrique Bezerra Leite:
"De nossa parte, cremos que o inciso XXXV do art. 5.° da CF não se
mostra violado pelo novel §2.° do art. 114 da CF, uma vez que a
garantia do acesso ao Judiciário ocorre nas hipóteses de lesão ou
ameaça a direitos individuais, coletivos ou difusos. O inciso XXXV
do art. 5.° da CF, na linha do art. 8.° da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, assegura o amplo acesso à prestação
jurisdicional na hipótese de lesão a direitos fundamentais,
reconhecidos pela Constituição e pela lei.
Ora, o dissídio coletivo de natureza econômica não tem por objeto
proteger direito preexistente, lesado ou ameaçado de lesão. Ao
revés, por meio dele o que se pretende é criar direito novo, de
natureza abstrata, por meio do poder normativo especialmente
atribuído à Justiça do Trabalho, destinado à categoria profissional
representada pela entidade sindical suscitante. Daí a natureza
constitutiva deste tipo especial de ação coletiva, pois cria novos
direitos entre os representantes das categorias econômica e
profissional.
(...)" (in Curso de Direito Processual do Trabalho, 8. Ed, São Paulo:
LTr, 2010, p. 1128/1129)
Diante do exposto, dou provimento ao recurso ordinário para, em
razão do acolhimento da preliminar de falta de comum acordo para
o ajuizamento do dissídio coletivo, julgar extinto o processo, sem
resolução de mérito, em relação aos recorrentes, nos termos do art.
267, IV, do Código de Processo Civil de 1973 (art. 485, IV, do novo
Código de Processo Civil), resguardadas, entretanto, as situações já
estabelecidas, ao teor do art. 6°, § 3°, da Lei n° 4.725/65. Custas
revertidas.
ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Seção Especializada em Dissídios
Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade,
conhecer do recurso ordinário e, no mérito, dar-lhe provimento para,
em razão do acolhimento da preliminar de falta de comum acordo
para o ajuizamento do dissídio coletivo, julgar extinto o processo,
sem resolução de mérito, em relação aos recorrentes, nos termo do
art. 485, IV, do CPC, resguardadas, entretanto, as situações já
estabelecidas, ao teor do art. 6°, § 3°, da Lei n° 4.725/65. Custas
invertidas.
Brasília, 24 de abril de 2017.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA
Ministra Relatora