Intimado(s)/Citado(s):
- DOUGLAS CARLOS RIBEIRO DA SILVA
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO
INTIMAÇÃO
Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 4678688
proferida nos autos.
SENTENÇA
RELATÓRIO
Trata-se de reclamação trabalhista proposta por DOUGLAS
CARLOS RIBEIRO DA SILVA em face de NUTRICIUM INDÚSTRIA
E COMÉRCIO LTDA. – ME, pretendendo o pagamento das verbas
rescisórias advindas da dispensa sem justa operada em
18/12/2019, bem como das multas celetistas correspondentes.
Juntou documentos e deu à causa o valor de R$ 17.795,65
(dezessete mil, setecentos e noventa e cinco reais e sessenta e
cinco centavos).
Regularmente notificada, a Reclamada compareceu à audiência
inicial. Rejeitada a 1ª proposta de conciliação, apresentou defesa
escrita (ID 52de896), com documentos, arguindo preliminares e
pugnando, no mérito, pela improcedência dos pedidos.
O Autor manifestou-se sobre a defesa e documentos a ela
acostados (ID e6a9878).
Tutela antecipada deferida (ID b533f33), sem ter, contudo, qualquer
efeito prático (ata de ID 2537cd7).
Realizada audiência de instrução (ata de ID af77423), a Reclamada
injustificadamente não compareceu, oportunidade em que o Autor
requereu a aplicação da confissão quanto à matéria de fato
constante da inicial.
Sem outras provas, encerrou-se a instrução. Prejudicada a
derradeira proposta de conciliação.
É, em apertada síntese, o breve relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
I. Inépcia da inicial – Confusão com mérito
O Reclamante pleiteou o pagamento das verbas rescisórias e
multas celetistas, apresentando uma inicial direta e pontual, clara e
objetiva, não padecendo de quaisquer vícios capazes de maculá-la,
tendo em vista que dos fatos alegados decorreram de sua
conclusão natural e lógica, tanto que possibilitou à Reclamada
produção de ampla e farta defesa.
Na verdade, confunde a Reclamada mérito com pressuposto
processual, eis que o fato de a inicial conter supostas
inconsistências ou impertinências não a impede de ser apreciada
por este Juízo quando da análise das provas existentes nos autos, o
que apenas se verá quando do meritum causae.
Rejeito , pois, tal preliminar.
II. Inépcia – Valores líquidos
Rejeito , igualmente, aludida preliminar, haja vista que o Reclamante
estimou corretamente os valores atinentes a todas as pretensões
formuladas na inicial, tudo em coro com os §§ 1º e 3º, do artigo 840,
da CLT.
III. Prescrição quinquenal parcial
Não há prescrição a declarar, pois, formulando o Reclamante tão
somente pedido de pagamento de verbas rescisórias advindas de
um contrato encerrado em 18/12/2019 e tendo sido ajuizada a
presente reclamação trabalhista em 14/06/2021, tem-se que todos
os pedidos formulados estão inseridos dentro do quinquênio
constitucional, na forma do art. 7º, XXIX, da CF/88 e nos termos da
Súmula 308, I, do C. TST.
Em razão disso, não pronuncio a prescrição quinquenal arguida.
IV. Ausência da Reclamada à audiência de instrução –
Confissão ficta
A Reclamada, em que pese devidamente cientificada, na audiência
inicial (ata de ID 2537cd7), de que deveria comparecer à audiência
de instrução para prestar seu depoimento pessoal, ausentou-se
injustificadamente (ata de ID af77423), o que atrai a incidência da
confissão ficta em relação às matérias fáticas constantes da inicial,
nos termos da Súmula 74, do C. TST, verbis:
"SÚMULA 74/TST
Aplica-se a pena de confissão à parte que, expressamente intimada
com aquela cominação, não comparecer à audiência em
prosseguimento, na qual deveria depor."
Pontua-se que a regra determina expressamente a incidência da
confissão para qualquer das partes que não compareça à audiência
em que deveria depor, notadamente quando foi devidamente
cientificada de que seria colhida a prova oral.
Desse modo, diante da confissão ficta, reputo verdadeiros os fatos
afirmados pelo Reclamante na inicial. Todavia, pelo fato desta
presunção ser relativa, deve ser examinada em confronto com as
provas documentais pré-constituídas nos autos, acaso existentes .
V. Acordo extrajudicial descumprido – Verbas rescisórias –
Multas
Afirmou o Reclamante, na inicial, que “após receber a carta de aviso
prévio, foi obrigado a aceitar proposta de parcelamento das verbas
rescisórias, incluindo FGTS e multa de 40%, pois na situação de
parte mais fraca da relação, preferiu receber, naquele momento, o
valor parcelado à não receber nada. Acontece que a reclamada
iniciou os pagamentos ajustados e sem qualquer motivo parou
de depositar os valores na conta do reclamante ", motivo pelo
qual pretendeu o recebimento do montante remanescente de R$
6.423,55 (seis mil, quatrocentos e vinte e três reais e cinquenta e
cinco centavos), bem como diferenças de FGTS, no valor de R$
1.239,45 (mil, duzentos e trinta e nove reais e quarenta e cinco
centavos), além da incidência das multas celetistas.
Diante da presunção legal de veracidade quanto à matéria fática
constante da inicial, a qual não foi elidida por qualquer prova em
sentido contrário, declaro que, de fato, as partes firmaram um
acordo extrajudicial (documento de ID f8e258e), envolvendo
quitação de verbas rescisórias e que a Reclamada o descumpriu
parcialmente .
Dessa forma, condeno a Reclamada ao pagamento de R$ 6.423,55
(seis mil, quatrocentos e vinte e três reais e cinquenta e cinco
centavos), atinente às parcelas rescisórias devidas, bem como da
quantia de R$ 1.239,45 (mil, duzentos e trinta e nove reais e
quarenta e cinco centavos), a título de diferenças de FGTS, tudo
nos exatos limites da litiscontestatio (artigos 141 e 492, ambos do
CPC).
Defiro , ainda, a multa do § 8º, do art. 477, da CLT, no importe de 1
(uma) remuneração autoral, pelo atraso no pagamento das verbas
rescisórias mediante o inconteste descumprimento do prazo
consignado no § 6º, do mesmo dispositivo legal, mesmo porque, em
face da confissão ficta na qual a Ré se incorreu, foi atestada, com o
descumprimento parcial do acordo extrajudicial firmado entre as
partes, a ausência de quitação escorreita das parcelas rescisórias
incontroversamente devidas.
Enfim, diante da indubitável dispensa sem justa causa, defiro a
incidência da multa do artigo 467, da CLT sobre o valor total
pendente de pagamento, em face da patente mora empresária, qual
seja, o importe de R$ 3.831,50 (três mil, oitocentos e trinta e um
reais e cinquenta centavos).
VI. Danos morais
O Reclamante pugnou pelo pagamento de indenização por danos
morais, pois com a ausência de pagamento de salário e da
rescisão, encontrou-se privado da subsistência e das garantias
mínimas a que um trabalhador e sua família têm direito, bem como
teve seu nome negativado no meio creditício.
De fato, a ausência de pagamento de verbas alimentares não
podem ser toleradas por este Poder Judiciário, não podendo a
eventual falta de recursos financeiros da Ré justificar a sonegação
de parcelas trabalhistas elementares, eis que, conforme artigo 2º,
da CLT, os riscos do empreendimento econômico são de assunção
do empregador e há prevalência, no ordenamento jurídico nacional,
do caráter forfetário conferido aos salários.
Não bastasse, a ausência de quitação das verbas ora deferidas
acarretou ao Reclamante, além de problemas para sua
subsistência, dificuldades no meio creditício, com exposição
negativa de seu nome e reputação, pois depende de seu salário
para honrar suas dívidas, conforme denunciou o documento de ID
daa2f38.
Como cediço, o dano moral (artigo 5º, V e X, da CF/88) é a lesão a
direito da personalidade, caracterizada pela dor e humilhação que,
de forma anormal, causa grande sofrimento e abalo mental,
intelectual ou mesmo psíquico/psicológico ao indivíduo.
Para configuração da responsabilidade civil (artigos 186 e 927, do
CCB), é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: a)
ato ilícito voluntário, omissivo ou comissivo, da Ré; b) dano
experimentado que deve se mostrar certo, atual e subsistente; c)
nexo causal entre conduta empresária e dano; d) culpa da
Reclamada.
No presente caso, nota-se que a ausência de pagamento das
próprias verbas da rescisão contratual extrapolou os limites do
razoável e do proporcional na esfera de atuação do poder diretivo
da Reclamada, mormente porque se trata de verbas de caráter
alimentar, sem as quais o Reclamante não consegue viver
dignamente.
A Reclamada, assim, incorreu em ato ilícito que atingiu a esfera
extrapatrimonial do Reclamante sobremaneira, carecendo, pois, de
compensação, na forma dos artigos 1º, III; 3º, IV e 5º, X, da
Constituição da República Federativa do Brasil e 186 e 927, do
CCB.
Portanto, diante de todo o exposto, condeno a Reclamada ao
pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$
3.000,00 (três mil reais).
Justifica-se referido valor pela gravidade da conduta comissiva e
omissiva (ausência de quitação das verbas rescisórias) da
Reclamada; pela extensão do dano, nos termos do art. 944/CCB
(pelo fato de expor, de forma iminente, o Reclamante ao meio
creditício e pelo abalo psicológico profundo) e pela capacidade
financeira da Reclamada.
Não bastasse, pondera-se que referida quantia corresponde a um
salário e meio do Reclamante e serve, igualmente, como medida
pedagógica exemplar a fim de que a Reclamada não cometa
condutas lesivas como estas.
VII. Compensação
Apesar de arguida a tempo e modo (Súmula 48/TST e artigo
767/CLT), indefiro a compensação genérica requerida, diante da
ausência de comprovação de parcelas pagas de mesma natureza
jurídica (Súmula 18/TST).
IX. Juros e Correção
No que concerne ao índice de juros e de correção dos débitos
trabalhistas discutidos nos autos da Ação Declaratória de
Constitucionalidade 58/DF, o Plenário do E. STF proferiu decisão na
última sessão do ano de 2020, com eficácia vinculante , nos
seguintes termos:
“O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação,
para conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 879, § 7º,
e ao art. 899, § 4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467 de
2017, no sentido de considerar que à atualização dos créditos
decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos
recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser
aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos
índices de correção monetária e de juros que vigentes para as
condenações cíveis em geral, quais sejam, a incidência do IPCA-E
na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa
SELIC (art. 406 do Código Civil), nos termos do voto do Relator."
Assim, nos termos da decisão referida acima, observar-se-á a
incidência do IPCA-E na fase pré-judicial (fase anterior à notificação
da Reclamada) e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC, de
modo que, considerando que a SELIC já engloba juros e correção
monetária, fica vedada a cumulação com outros índices.
Registra-se, ainda, que a citação, no sistema processual do
trabalho, é ato administrativo que deve ser praticado pela Secretaria
da Vara, como consequência da mera distribuição da demanda
(artigo 841/CLT). É imperioso destacar ainda que, para o Autor da
demanda, a notificação se dá no “ato da apresentação da
reclamação" , quando, então, para este, inicia-se a fase judicial do
processo. Além disso, o artigo 883/CLT determina, de forma
expressa, que os juros de mora, em qualquer caso, são devidos a
partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial.
Portanto, para fins de liquidação do processo, fica estabelecida a
aplicação do IPCA-e para a correção das parcelas para a fase pré-
judicial e a adoção da SELIC, a partir da data da distribuição desta
demanda, nos termos da ADC 58/DF .
X. INSS e IRRF
Não há se falar em incidência de contribuições previdenciárias nem
fiscais, pois as parcelas, objeto da presente condenação, são
exclusivamente de natureza indenizatória, o que se declara também
para os fins do § 3º, do artigo 832, da CLT.
XI. Justiça gratuita
Nos termos do § 3º, do artigo 790, da CLT, consoante novel
redação trazida com a reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017),
presume-se pobre, para os fins procedimentais trabalhistas, a
pessoa que comprovar renda igual ou inferior a 40% do teto dos
benefícios do Regime Geral de Previdência Social (ou seja, R$
2.573,43, em decorrência da majoração do teto).
No presente caso, diante dos recibos salariais acostados aos autos,
em virtude daquilo que ordinariamente acontece (artigos 852-D/CLT
e 375/CPC) - no sentido de que, mesmo que incontinenti
reempregado, o trabalhador normalmente recebe remuneração
próxima à do emprego anterior, bem como em face da declaração
de pobreza anexada à inicial, defiro ao Reclamante os benefícios
da justiça gratuita.
Por outro lado, os benefícios da justiça gratuita somente se
destinam à pessoa natural, “cuja situação econômica não lhe
permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado,
sem prejuízo do sustento próprio ou da família" (§ 2º, artigo 2º, da
Lei nº 1.060/50) e na novel dicção do § 3º, do art. 790, da CLT,
“àqueles que perceberem salário igual ou inferior ao dobro do
mínimo legal, ou declararem, sob as penas da lei, que não estão em
condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento
próprio ou de sua família".
Não alcançam, portanto, as pessoas jurídicas (sociedades
empresárias e entidades de direito privado sem fins lucrativos),
ainda que estejam em dificuldades financeiras, na medida em que,
no âmbito do Direito do Trabalho, todas as empresas se equiparam
ao empregador para todos os efeitos trabalhistas (art. 2º, § 1º, da
CLT), não se lhes conferindo nenhum privilégio em razão dessa
condição.
Ante o exposto,