Intimado(s)/Citado(s):
- LOJAS RENNER S.A.
- SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCIO DE
FLORIANOPOLIS
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA
Recurso de embargos interposto pela Lojas Renner S.A. (fls. 5.295-
5.303), sob a égide da Lei nº 13.015/2014, contra o acórdão
proferido pela Primeira Turma desta Corte superior (fls. 5.284-
5.293).
Presentes os pressupostos extrínsecos.
PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS
A Primeira Turma negou provimento ao agravo em recurso de
revista interposto pela reclamada, quanto à escala de revezamento
e repouso semanal remunerado das empregadas mulheres,
mediante os fundamentos sintetizados na ementa, verbis:
AGRAVO. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA.
EMPREGADAS MULHERES. TRABALHO NO COMÉRCIO.
REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. ESCALA DE
REVEZAMENTO PREVISTA NO ART. 386 DA CLT. RECEPÇÃO
PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ESPECIFICIDADE EM
RELAÇÃO À LEI Nº 10.101/2000. PREVALÊNCIA. MATÉRIA
DECIDIDA PELA SDI-I/TST. Impõe-se confirmar a decisão
monocrática mediante a qual se denegou seguimento ao recurso de
revista da reclamada, uma vez que o acórdão regional está em
conformidade com o entendimento firmado pela Subseção
Uniformizadora desta Corte, no sentido de que o art. 386 da CLT -
que estabelece escala quinzenal para a fruição do repouso semanal
remunerado aos domingos para as empregadas mulheres - foi
recepcionado pela Constituição Federal, e, por ser mais específico,
deve prevalecer sobre o disposto no art. 6º, parágrafo único, da Lei
nº 10.101/2000. (TST-E-ED-RR-619-11.2017.5.12.0054, SDI-I,
DEJT 11.02.2022).
Agravo conhecido e não provido.
No recurso de embargos, a reclamada requer a exclusão da
condenação ao pagamento dos domingos quinzenais trabalhados
em dobro, bem como a adoção da escala de trabalho do art. 36 da
CLT. Afirma que a Lei não prevê distinção em relação ao trabalho
masculino ou feminino aos domingos. Indica ofensa aos arts. 5º, I,
da Constituição Federal, 36, 386 da CLT, e 6º da Lei nº
10.101/2000. Colaciona arestos.
Analiso.
De plano, cumpre assinalar que, conforme a atual redação do art.
894, II, da CLT, é inviável, o exame da pretensão quanto à
apontada violação dos arts. 5º, I, da Constituição Federal, 36, 386
da CLT, e 6º da Lei nº 10.101/2000.
A pretensão recursal, fundada em arestos divergentes colacionados
às fls. 5.297-5.300, encontra óbice no § 2º do art. 894 da CLT,
porquanto superados pela jurisprudência atual, iterativa e notória
deste Tribunal, que é firme no sentido de que tal como o art. 384 da
CLT (revogado pela Lei nº 13.467/2017), o art. 386 da CLT também
foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, e, por ser mais
específico, deve prevalecer sobre o disposto no art. 6º, parágrafo
único, da Lei nº 10.101/2000.
Nesse sentido o seguinte precedente da subseção I Especializada
em Dissídios Individuais do TST:
"RECURSO DE EMBARGOS DA EMPRESA RECLAMADA.
PROTEÇÃO AO MERCADO DE TRABALHO DA MULHER - ART.
7º, XX, DA CF/88. TRABALHO AOS DOMINGOS NAS
ATIVIDADES DO COMÉRCIO EM GERAL. APLICAÇÃO DA
ESCALA DE REVEZAMENTO QUINZENAL PREVISTA NO ART.
386 DA CLT. Cinge-se a controvérsia à aplicação da escala de
revezamento que favoreça o descanso semanal com maior
frequência aos domingos das mulheres que trabalham em atividade
de comércio, dada a aparente antinomia que é suscitada entre o
disposto no art. 386 da CLT e no art. 6º, parágrafo único, da Lei n.
10.101/2000, com redação dada pela Lei n. 11.603/2007. Aplica-se
ao caso a ratio decidendi fixada pelo Tribunal Pleno do TST, na
rejeição da arguição de inconstitucionalidade do art. 384 da CLT,
com o posterior endosso do STF que, ao julgar o RE 658312, com
repercussão geral, em sessão virtual concluída em 14/set/2021,
firmou a seguinte tese: "O art. 384 da CLT, em relação ao período
anterior à edição da Lei n. 13.467/2017, foi recepcionado pela
Constituição Federal de 1988, aplicando-se a todas as mulheres
trabalhadoras". Antes, as premissas ressaltadas pelo Tribunal Pleno
do TST, ao rejeitar a arguição de inconstitucionalidade do art. 384
da CLT, foram substancialmente as de que o "ônus da dupla
missão, familiar e profissional, que despenha uma mulher
trabalhadora" e "o peso maior da administração da casa e da
educação dos filhos acaba recaindo sobre a mulher". Com rigor,
essas são as mesmas premissas que justificariam a aplicação da
regra protetiva expressamente prevista no art. 386 da CLT, a qual
permanece intacta após a denominada "Reforma Trabalhista" (Lei n.
13.467/2017). Em proveito da recepção pela ordem constitucional
do art. 386 da CLT e de sua prevalência ante a regra mais
abrangente do art. 6º da Lei n. 10.101/2000, põem-se em enlevo as
seguintes premissas jurídicas que, com efeito, repercutem dados e
valores culturais: a) o art. 7º, XX da Constituição prevê, entre os
direitos fundamentais, a "proteção do mercado de trabalho da
mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei", o que
induz à relevância de preceitos de lei que viabilizem
progressivamente o ingresso das mulheres no mundo institucional
do trabalho, sem embargo do tempo maior que dedicam à
reprodução, formação e sociabilização da força de trabalho (cabe
redarguir, como argumento ad terrorem e em desalinho com dados
estatísticos, a ilação de ser a proteção das condições de trabalho da
mulher um fator de redução da sua empregabilidade); b) em
respeito à tridimensionalidade da norma jurídica, e agora sob o
prisma histórico-cultural, é tempo de o Direito inverter a lógica
perversa de desconsiderar ou comprometer o tempo dedicado à
reprodução (trabalho reprodutivo) da fonte de trabalho mediante a
atribuição à mulher de trabalho produtivo em condição incompatível
com a sua função biológica, econômica e social; c) o art. 386 da
CLT revela um estágio evolutivo na concretização do art. 7º, XX da
Constituição que não comporta retrocesso se a restrição que se
busca, por meio da atividade jurisdicional e de lege ferenda, não
atende à exigência de ser "medida compatível com a natureza
desses direitos e exclusivamente com o objetivo de favorecer o bem
-estar geral em uma sociedade democrática" (art. 4º do Pacto
Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais); d) a
progressividade dos direitos humanos e fundamentais - prevista no
art. 2º.1 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais, no art. 26 da Convenção Americana de Direitos
Humanos e, na espécie, no caput do art. 7º da Constituição -
reveste-se de caráter normativo e se submete ao controle
jurisdicional, consoante vem de decidir a Corte Interamericana de
Direitos Humanos desde o caso Acevedo Buendía e outros vs Peru;
e) o critério da especialidade, entre aqueles que servem à resolução
de antinomias entre normas jurídicas, não é oponível à prevalência
do art. 386 da CLT, em lugar do art. 6º da Lei n. 10.101/2000, dado
que é aquele, e não este, o dispositivo que veicula a norma
especial, vale dizer: da norma generalíssima contida na Lei n.
605/1949, raiz de todo o debate, destacam-se os destinatários da
Lei n. 10.101/2000 (art. 6º), ou seja, todos os trabalhadores do
comércio, e, dentre estes, destacam-se as mulheres trabalhadoras
no comércio em geral - tuteladas, com maior especificidade, pelo
art. 386 da CLT. Do contrário, a proteção de outros grupos
vulneráveis potencialmente ativados no comércio - como crianças,
adolescentes, idosos, pessoas com deficiência ou povos originários
- estaria inviabilizada ante a predominância da regra consagrada,
para todos, e todos indistintamente, na Lei n. 10.101/2000. Recurso
de embargos conhecido e desprovido" (Ag-E-ED-RR-1584-
77.2016.5.12.0036, Subseção I Especializada em Dissídios
Individuais, Redator Ministro Augusto César Leite de Carvalho,
DEJT 11/02/2022).
Diante do exposto, inviável o processamento do recurso.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, com amparo nos arts. 93, VIII, do Regimento
Interno do Tribunal Superior do Trabalho e 2º do Ato
TST.SEGJUD.GP nº 491/2014, NEGO SEGUIMENTO ao recurso
de embargos.
Publique-se.
Brasília, 04 de abril de 2022.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
HUGO CARLOS SCHEUERMANN
Ministro Presidenet da Primeira Turma